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23 de maio de 2012
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16:16

Só a Internet salva a CPI do vexame

Por
Sul 21
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Waldemir Barreto/Agência Senado

Por Pedro Simon (*)

O projeto da Ficha Limpa estava morto, esquecido, enterrado e sepultado nas gavetas mais ilustres do Congresso Nacional. Até que subitamente ressuscitou, ergueu-se, ganhou força e fôlego para reviver, vigoroso e irrefreável, na pauta do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal. Virou lei — e mandamento incontestável da política ética e decente que exige o povo brasileiro — não por decisão de nossa elite política, mas pela pressão e imposição do próprio povo, através das redes sociais.

Quando o projeto chegou às mãos do deputado Michel Temer, em outubro de 2009, o então presidente da Câmara alegou que a Ficha Limpa “não tinha apoio político”. Só a pressão popular, cada vez mais consistente nos oito meses seguintes, permitiu que a lei fosse enfim sancionada em junho de 2010 pelo presidente Lula. Os políticos perceberam que não seria sensato desafiar a vontade popular, principalmente em ano eleitoral.

A pressão externa sobre o Congresso começou pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), que recolheu mais de 1,5 milhão de assinaturas, superando a margem de 1% do eleitorado (1,3 milhão de assinaturas) de cinco Estados exigida pela Constituição para projetos de iniciativa popular. Com ela, o Congresso quebrava um jejum de cinco anos para matérias com origem externa ao rito parlamentar. Nas redes sociais, além do patrocínio decisivo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Ficha Limpa teve outro impulso notável. Através da Avaaz.org, uma rede de ativistas para mobilização social que reúne 13 milhões de internautas de 15 línguas diferentes, a campanha da Ficha Limpa tornou-se um top trending topic (assunto mais postado) do Twitter por uma semana. Outros dois milhões de assinaturas foram colhidos virtualmente, graças ao ativismo das redes sociais. Quando o projeto foi enfim aprovado, o senador Cristovam Buarque tuitou: “O Ficha Limpa é uma vitória dos internautas”.

Agora, chegou o momento de convocar, outra vez, as redes sociais. É preciso salvar a CPI do Cachoeira do fiasco e do vexame de um acordo imoral entre os suspeitos de sempre. Partidos, políticos, governantes, empresários e lideranças flagrados em conversas pouco republicanas e nada decentes, em milhares de grampos da Polícia Federal autorizados pela Justiça, aparecem se acertando para livrar uns e outros da inevitável condenação sob o odor insuportável da pizza que nos nauseia e repugna. As investigações já estão concluídas, os autos já são públicos, os constrangimentos já foram explicitados. O que resta à CPI é fazer o que deve ser feito: avaliar os indícios, elementos e provas coletados e cumprir com o seu dever perante a sociedade brasileira, apontando os culpados e recomendando as soluções devidas para coibir a ação de organizações criminosas no interior da máquina pública.

Mas, nada disso acontecerá se o Congresso não for, outra vez, virtualmente cercado pelas redes sociais da cidadania. Precisamos que os brasileiros, neste admirável mundo novo da internet, façam o que parcela ponderável de senadores e deputados não querem fazer: tomem posição, adotem atitudes, avancem, protestem e denunciem a inércia, a omissão, o conluio, a cumplicidade. Hoje, graças à mobilização consciente de milhões de pessoas que nunca vieram a Brasília, temos um país regido por uma legislação que exige apenas o óbvio: a política como um território livre e aberto apenas às pessoas de ficha limpa, de biografia respeitável e respeitada. A Ficha Limpa é a comporta essencial para impedir que a boa política seja afogada pela cachoeira dos piores instintos humanos.

O Facebook no Brasil é compartilhado por 50 milhões de pessoas, quase metade do eleitorado, um de cada quatro brasileiros. É uma multidão que cresce de forma vertiginosa. Nos últimos seis meses surgiram mais de 16 milhões de brasileiros na rede do Facebook. É o eleitorado somado do Rio de Janeiro e de Goiás, duas áreas centrais de atuação da construtora Delta e do bicheiro Cachoeira. É mais da metade do eleitorado de São Paulo, o maior colégio do país.

No Orkut, são mais de 30 milhões de usuários. São quase 6 milhões de usuários do Twitter, num país onde apenas 30 milhões de residências possuem internet. O Brasil, hoje, é o país de maior crescimento no mundo em termos de redes sociais.
Fica aqui, meu apelo. Vocês das redes sociais — do Facebook, do Orkut, do Twitter —, que acessam blogs e enviam e-mail, ajudem o Brasil a evitar o fiasco desta CPI do Cachoeira. Invadam a grande rede, cerquem virtualmente o Congresso e façam jorrar sobre senadores e deputados a indignação nacional contra esta vergonha armação que ameaça jogar o Parlamento no fundo do poço.

Mostrem sua indignação, escrevam, gritem, denunciem. Apesar de tudo, o Congresso e os políticos não são surdos à voz das ruas, que inventam e sustentam suas carreiras. Exerçam sua cidadania.

Não podemos ter vergonha do Parlamento. Precisamos nos orgulhar dos brasileiros. Este é o apelo que faço aqui, agora. O Brasil, conectado, precisa reconectar o Parlamento com a dignidade. Mexam-se!

* Pedro Simon é senador pelo PMDB-RS


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