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3 de maio de 2012
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09:00

Orçamento Participativo enfrenta desafios em renovar-se e cumprir demandas

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Sul 21
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Assembleias regionais e temáticas deste ano começaram no dia 16 de abril | Foto: Ivo Gonçalves PMPA

Samir Oliveira

Inaugurado em 1989, durante a primeira gestão petista na prefeitura de Porto Alegre, o Orçamento Participativo (OP) ganhou as ruas da Capital e se tornou referencia mundial em termos de influência da cidadania nas decisões dos governantes. Hoje, passados 23 anos desde o início dessa experiência, o OP conseguiu sobreviver à troca de forças políticas no comando da cidade, mas enfrenta o desafio de se renovar junto à sociedade e de zerar compromissos atrasados, sob pena de cair em descrença junto à população.

Na visão do urbanista italiano Giovanni Allegretti, essas são duas grandes barreiras para o desenvolvimento do Orçamento Participativo. O especialista, que estudou a implementação do processo na gestão de Olívio Dutra (PT – 1989-1992) em Porto Alegre, acredita que permissão ilimitada para a reeleição dos delegados do OP favorece o enraizamento de feudos que podem contaminar as decisões.

Allegretti acompanhou o desenvolvimento do OP em diversas cidades europeias, como Lisboa, em Portugal, e aponta que a perpetuação de grupos nas assembleias gera uma “relação clientelista” que não necessariamente envolve o poder público. Esse fenômeno – que o especialista chama de “mecanismo perverso para atender interesses” – ocorre dentro da sociedade civil organizada, que passa a eleger delegados para o Orçamento Participativo através de barganhas em cima das demandas em votação.

Alegretti aponta que a prefeitura poderia tentar resolver a falta de renovação com uma discussão no Conselho do OP sobre a limitação ou proibição total das reeleições. Atualmente, cada um dos 96 conselheiros pode submeter seu nome à votação todos os anos.

Mesmo que isso não fosse possível, a renovação ocorreria num espectro muito limitado, já que não é qualquer um que pode se candidatar à função (não remunerada) de conselheiro do OP. Para isso, é preciso ter sido delegado do Orçamento Participativo por pelo menos um ano. Traduzindo em números, isso significa que a renovação pode ocorrer apenas dentro do espectro de 1,5 mil delegados que compõem o processo.

Obras atrasadas enfraquecem credibilidade do OP

Outro fator negativo que aflige o Orçamento Participativo de Porto Alegre é o atraso no andamento das obras escolhidas pela população e o não cumprimento do que é determinado pelos cidadãos. Esse problema não recai somente sobre as costas da atual administração comandada pelo prefeito José Fortunati (PDT), que assumiu no início de 2010. Desde 1992, quando o processo completava apenas quatro anos de vida, as demandas se acumulam ou se perdem em meio à burocracia do OP.

Cezar Busatto garante que prefeitura quer recuperar demandas atrasadas | Foto: Ricardo Stricher/PMPA

Um levantamento feito pela ONG Cidade, que compilou dados da prestação de contas do OP, demonstra que, de 1990 a 2010, foram orçadas 6.659 obras, das quais 5.444 foram concluídas. Restam, ainda, 1.215. Com as informações de 2011, são 7.384 demandas escolhidas pela população, 5.559 finalizadas e 1.785 sem conclusão.

A curva começou a se inverter em 1992, mas o processo de não atendimento das demandas se tornou mais intenso a partir do ano 2000 e não parou de crescer até 2003. Em 2004 houve uma ligeira reversão nesse quadro, mas em 2005 – quando, depois de 16 anos consecutivos de governos petistas, José Fogaça assume a prefeitura filiado ao PPS – o número de obras inconclusas volta a aumentar. Em 2011, último ano de execução do Orçamento Participativo, foram finalizadas apenas 155 das 683 demandas escolhidas pela população. Outras 469 estão em andamento e 59 ainda não foram iniciadas. Para este ano, o Plano de Investimentos do OP conta com 565 demandas, das quais 350 já possuem valores orçados e somam R$ 106 milhões.

O secretário municipal de Coordenação Política e Governança Local de Porto Alegre, Cezar Busatto (PMDB), é o responsável pela condução administrativa do processo na cidade e reconhece que a não conclusão das obras fragiliza o Orçamento Participativo. Mas ele assegura que o resgate das demandas atrasadas é uma prioridade do prefeito José Fortunati. “Em 2010, voltamos a discutir um resgate dos atrasados nos limites das nossas possibilidades técnicas e orçamentárias. Em 2011, viabilizamos 428 demandas que estavam paradas desde 1993 e ainda estão sendo executadas”, informa.

O peemedebista lembra que, em 2007, ficou estabelecido junto ao Conselho do OP que os recursos seriam divididos ao meio: metade iria para novas obras e o restante seria aplicado nas solicitações em atraso. Neste ano, entretanto, ficou decidido que somente as novas demandas entrarão no Plano de Investimentos. “Esse passivo já está bastante diminuído e temos que evoluir para zerá-lo completamente. Demandas atrasadas significam a fragilização do processo”, reconhece Busatto.

Prefeitura aposta na internet e nas redes sociais para atrair jovens ao Orçamento Participativo

A constatação de que o Orçamento Participativo de Porto Alegre está envelhecendo não é um mero recurso retórico para justificar seus 23 anos de existência. As pessoas que fazem o OP acontecer hoje são, em grande medida, as mesmas que iniciaram o processo em 1989.

Um levantamento feito pela ONG Cidade em 2005 mostra que apenas 1,7% dos conselheiros do Orçamento Participativo estava na faixa dos 16 aos 25 anos, enquanto 44% tinham 50 anos ou mais. Para tentar atrair novamente os jovens às fileiras do OP, a prefeitura inaugurou na semana passada uma série de ferramentas que adapta o processo à internet e às redes sociais.

“Está faltando que mais setores da sociedade de integrem ao Orçamento Participativo, que está envelhecendo. O OP precisa se tornar cada vez mais uma metodologia que represente os interesses da cidade”, avalia o secretário municipal de Coordenação Política e Governança Local de Porto Alegre, Cezar Busatto (PMDB).

Maioria dos participantes do OP tem mais de 50 anos de idade | Foto: Francielle Caetano/PMPA

Pelo novo sistema de participação virtual, a população poderá votar prioridades para o orçamento no site do OP. Além disso, os conselheiros e delegados serão chamados para as assembleias também por meio de mensagem no celular.

Outra inovação são as páginas do Orçamento Participativo no Facebook e no Twitter, onde são publicadas informações sobre as reuniões e novidades nos processos. A intenção da prefeitura é, inclusive, distribuir um tablet para cada um dos 96 delegados que tomarão posse em julho deste ano. Os equipamentos seriam emprestados em regime de comodato e a Procempa já trabalha com a capacitação dos futuros usuários, que poderão acompanhar a execução dos projetos através da nova ferramenta.


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