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19 de setembro de 2011
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16:13

Às vésperas do discurso de Abbas, comunidade internacional debate criação do Estado palestino

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Sul 21
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Em discurso nesta sexta, na Assembleia Geral da ONU, Mahmoud Abbas deve pedir formalmente o reconhecimento do Estado palestino | Foto: Marco Castro/UN Photo

Igor Natusch e Daniel Cassol

Às vésperas do discurso, na 66ª Assembleia Geral das Nações Unidas, do presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), a comunidade internacional se divide entre o apoio à criação do Estado Palestino e a tentativa de dissuadir Mahmoud Abbas de fazer o pronunciamento sem uma negociação com Israel. Em discurso na próxima sexta-feira (23), Abbas deve pedir que a ANP, hoje uma entidade observadora não-membro da ONU, seja conhecida como Estado, como forma de negociar com Israel em outro patamar.

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Neste domingo, o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair, enviado especial do Quarteto (Estados Unidos, União Europeia, ONU e Rússia) para o Oriente Médio, disse que estão sendo realizados esforços para dissuadir os palestinos. “Vamos procurar uma maneira de obter algo que permita o reconhecimento de seus pedidos legítimos de criar um Estado e ao mesmo tempo de fato renovando a única coisa que vai produzir um Estado, que é uma negociação direta entre os dois lados”, disse Blair, em entrevista à rede norte-americana ABC.

Os palestinos pleiteiam a construção de um Estado a partir de territórios na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, com capital em Jerusalém Oriental. São as fronteiras que eram ocupadas de 1947, quando teve fim o jugo britânico, até 1967, quando foram invadidas por Israel durante a Guerra dos Seis Dias. Além disso, a Autoridade Palestina pede o retorno de todos os refugiados e o estabelecimento de um governo autônomo.

A iniciativa palestina contraria o que foi decidido nos acordos de paz de Oslo, assinados em 1993 entre o então primeiro-ministro israelense Yitzhak Rabin e o líder da Organização pela Libertação da Palestina (OLP), Yasser Arafat. Apesar de sinalizações de Barack Obama de que o pleito da ANP é até certo ponto legítimo, tanto Estados Unidos quanto Israel pedem que as fronteiras só sejam definidas depois de ampla discussão entre os interessados – o que, na prática, não se verifica há mais de um ano.

Neste domingo, Tony Blair afirmou que Estados Unidos e União Europeia tentam impedir pedido formal de Mahmoud Abbas | Foto: Alexandre Campbell/WEF

EUA podem barrar proposta no Conselho de Segurança

Para ser reconhecido o Estado palestino, é necessária a aprovação do Conselho de Segurança e de dois terços da Assembleia-Geral. Para evitar que a ONU reconheça a Palestina, será necessário o ônus de exercer o poder de veto no Conselho de Segurança – papel que o governo norte-americano já assinalou estar disposto a exercer. O desgaste político de uma decisão como essa, no entanto, é imprevisível, especialmente em um momento cheio de revoltas no mundo árabe. Na leitura de Mahmoud Abbas, a votação do pedido palestino em outubro consolidará a imagem da Palestina perante a comunidade internacional e colocará em outro patamar as negociações com Israel.

“A decisão (de ir até a ONU) é decorrência do unilateralismo israelense”, argumenta Mohamed Shtayeh, uma das principais forças políticas do partido Fatah e que deve acompanhar Abbas durante a assembleia da ONU. Lembrando que a própria ONU decidiu, em 1947, que o então território britânico deveria ser dividido entre árabes e judeus, Shtayeh afirma que a Autoridade Palestina está simplesmente “levando a luta de volta para o lugar onde ela surgiu”. Já o Hamas informou neste domingo que apoiará a declaração de um Estado palestino desde que Israel não seja reconhecido, nem que seja cedida nenhuma parte do território histórico palestino.

O correspondente do jornal El País em Israel, Enrique González, acredita que Abbas está “indo pelo prêmio máximo” e, na medida em que os acontecimentos evoluírem, pode contentar-se com menos. “A curto prazo, o recurso à ONU não trará mudanças nem na ocupação nem na vida cotidiana na Cisjordânia e em Gaza. As consequências imediatas serão sobre o governo israelense, enfurecido; sobre Obama, colocado em situação muito incômoda; e sobre a União Europeia, levada uma vez mais a admitir que carece de consenso em sua política exterior”.

Charge: Latuff

Pedido será “anulação de todos os acordos”, diz Israel

A iminência do discurso de Abbas provocou reações de Israel. O vice-ministro de Relações Exteriores, Danny Ayalon, chegou a afirmar que, caso a Palestina insista com seu pleito, Israel considerará rompidos todos os acordos anteriormente traçados com a autoridade palestina. “Se os palestinos tomarem uma decisão unilateral, isso significará a anulação de todos os acordos e libertará Israel de todos os seus compromissos”, disse ele. A anexação dos blocos de assentamentos israelenses na Cisjordânia também foi levantada como uma possibilidade pelo vice-ministro.

A União Europeia e o governo dos EUA, por sua vez, mobilizaram suas forças diplomáticas para tentar evitar que o pleito da Palestina chegasse à ONU. Catherine Ashton, diplomata da União Europeia no Oriente Médio, estendeu sua estada em Israel para buscar um compromisso de palestinos e israelenses para a retomada das negociações. Já a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, enviou à região o conselheiro especial Dennis Ross e o emissário norte-americano para o Oriente Médio, David Hale.

Na agenda dos diplomatas, reuniões com Mahmoud Abbas e Benjamin Netanyahu, tentando retomar o processo de negociações antes que a proposta chegasse à assembleia da ONU. Há insinuações, também, de que os EUA podem diminuir sensivelmente ou mesmo retirar seu apoio econômico à Autoridade Palestina, caso os representantes insistam com sua solicitação.

Dilma recebe Mahmoud Abbas durante a posse como presidenta, em Brasília | Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

De qualquer modo, depois de mais de um ano de silêncio da parte dos israelenses, os palestinos reforçam que apenas uma alternativa “crível” pode evitar que a questão seja levada à apreciação da ONU. “Nossa prioridade agora é ir ao Conselho de Segurança e pedir nossa admissão”, acentua o ministro palestino das Relações Exteriores, Riyad al-Malki. “Mas estamos abertos a qualquer sugestão, de qualquer dos lados, para reiniciar as negociações com bases sólidas, termos de referência claros, um calendário claro e garantias claras. Vamos ver se alguém apresenta uma oferta crível que possa ser seriamente considerada”.

As movimentações israelenses nas áreas ocupadas indicam que as horas imediatamente posteriores ao discurso de Mahmoud Abbas podem ser bastante tensas. As tropas israelenses na Cisjordânia estão armadas com grandes quantidades de armas não letais, além de estarem preparadas para usar novas táticas de dispersão. A Autoridade Palestina, por sua vez, recebeu de Israel carregamentos com balas de borracha, granadas de efeito moral e gás lacrimogêneo. A ideia é impedir que manifestantes se aproximem de áreas críticas como postos de controle militar e o muro da Cisjordânia.

Dilma deve apoiar criação do Estado palestino

Primeira mulher a abrir uma Assembleia Geral das Nações Unidas, a presidenta brasileira Dilma Rousseff deve dizer, em seu discurso, que passou da hora de o mundo reconhecer a existência da Palestina. A questão não estará entre os temas centrais do pronunciamento, mas Dilma vai reforçar a postura brasileira de líder global e defensor de mudanças na geopolítica mundial.

Em dezembro do ano passado, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu a criação do Estado palestino, nas fronterias de 1967, durante visita de Mahmoud Abbas ao Brasil. “O Brasil tem defendido historicamente, e em particular durante meu gGoverno, a concretização da legítima aspiração do povo palestino a um Estado coeso, seguro, democrático e economicamente viável, coexistindo em paz com Israel”, afirmou Lula na ocasião.


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