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20 de julho de 2011
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10:02

A situação nos países árabes seis meses após as revoltas populares

Por
Sul 21
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Felipe Prestes e Igor Natusch

Desde o começo das manifestações na Tunísia, em dezembro do ano passado, o mundo árabe vê-se envolvido em uma série de protestos pedindo mudanças políticas nos países da região. Passados seis meses da queda de Zine al-Abidine Ben Ali, e cinco da deposição do ex-presidente egípcio Hosni Mubarak, ainda há muitos clamores por mudança, fazendo barulho na maioria dos países e ecoando em todo o mundo.

Egito

EGITO

As Forças Armadas tocam o governo provisório após a queda do ditador Hosni Mubarak, ocorrida em fevereiro. Eleições ocorrerão em novembro para a escolha de uma assembleia nacional constituinte. Os eleitos irão definir o novo sistema de governo. Apesar dos avanços, a população continua nas ruas, preocupada com o excesso de poder dos militares e pedindo a cabeça de todos os políticos que apoiavam o ditador. Recentemente, 15 ministros caíram e a situação econômica continua ruim, com o governo tendo que fornecer alimentos a famílias egípcias.

Síria

SÍRIA

A explosão de violência no país faz com que a Síria se torne, ao lado da Líbia, o mais sangrento palco de revoltas no mundo árabe. Segundo os rebeldes, mais de duas mil pessoas já teriam sido mortas por forças governamentais desde que o tom dos protestos aumentou, em março. O regime de Bashar al-Assad tem reagido com violência, mas a repressão não diminuiu a intensidade das manifestações – especialmente na capital Damasco, onde os últimos eventos foram os de maior presença popular desde o começo da revolta. Um evento batizado Encontro Consultivo para o Diálogo Nacional Abrangente, envolvendo governo e partidos de oposição, não foi capaz de indicar ações concretas para pacificar o país. Dos Estados Unidos, manifestações do presidente Barack Obama e da secretária de Estado Hillary Clinton apontam que o atual regime já perdeu a legitimidade e deve iniciar imediatamente uma negociação pacífica com as forças rebeldes. Ainda que as ações de al-Assad estejam sendo cada vez mais criticadas pela comunidade internacional, não há movimentação no sentido de uma intervenção no país – talvez devido ao exemplo da Líbia, alvo de uma missão da OTAN que se arrasta há meses sem remover Muammar Kadafi do poder.

Tunísia

TUNÍSIA

A queda do ditador Zine al-Abidine Ben Ali, no dia 14 de janeiro, não gerou estabilização política. Em seguida, caiu o primeiro-ministro interino Mohammed Ghannouchi, porque a população não o aceitava por ser aliado de Ben Ali. O atual primeiro-ministro Beji Caid Essebsi conduz um governo provisório com dificuldades. Extremistas islâmicos atacam delegacias, e há também conflitos entre os religiosos e intelectuais defensores do secularismo. Foi no interior que os conflitos começaram, devido às dificuldades econômicas. Há na Tunísia uma desigualdade regional entre litoral, mais rico, e interior. A crise econômica no país deixa 700 mil desempregados. Uma assembleia nacional constituinte irá ocorrer em 23 de outubro deste ano para definir as bases de um novo regime. O país segue convulsionado e sem uma solução para a crise.

Líbia

LÍBIA

Muammar Kadafi governa o país há 41 anos e era tido como elo entre inúmeras divisões tribais no país. A Líbia fica entre Tunísia e Egito e, na esteira dos vizinhos, revoltas populares estouraram no início do ano, mas só obtiveram adesão no leste do país. Forças organizadas pela população conseguiram derrotar o governo nesta região da Líbia, mas a reação das tropas de Kadafi demonstrou força para retomar a região, e o ditador também levou adiante uma repressão sangrenta a opositores. Em março, potências ocidentais iniciaram uma intervenção militar no país que, até o momento, não conseguiu inibir o ditador. Nesta terça (19), a Casa Branca afirmou que “tudo indica que Kadafi está perdendo”, o que diz muito pouco sobre a real situação da batalha. Segundo os norte-americanos, o ditador perde espaço por falta de dinheiro e combustível, e perde cada vez mais território.

Argélia

ARGÉLIA

Pressionado pelos protestos no começo do ano, o presidente Abdelaziz Bouteflika, no poder desde 1992, prometeu mudanças políticas no país. E, pelo menos até o momento, tem demonstrado inusitada disposição em cumprir sua palavra. Em maio, o conselho de ministros estabeleceu as diretrizes para uma consulta nacional, onde as propostas de diferentes grupos estão sendo ouvidas e cujo relatório final deve, se a promessa seguir sendo cumprida, guiar a redação da nova constituição argelina. O grupo governamental que recebe as propostas é liderado pelo presidente do senado da Argélia, Abdelkader Bensalah, e tem recebido partidos políticos, movimentos feministas, sindicatos e organizações estudantis, entre outros. Discute-se até uma mudança de modelo político, passando do semipresidencialismo para o presidencialismo pleno ou até mesmo o parlamentarismo. A ideia é que todas as reformas que não dependam de uma nova constituição sejam implementadas até maio de 2012, quando ocorrem eleições gerais na Argélia – a nova constituinte, caso a onda de mudanças siga forte no país, será convocada apenas após a votação.

Omã

OMÃ

No momento, o país prepara-se para as eleições dos Majlis Al Shura, espécie de conselho consultivo que corresponde ao parlamento de Omã. São mais de 1.300 candidatos inscritos, incluindo 82 mulheres, um recorde para o país. A grande quantidade de concorrentes para a votação, que ocorre em setembro, demonstra o crescente interesse da população omaniana sobre os destinos políticos do país. Ainda que tenha encarado alguns protestos no começo do ano, pedindo especialmente aumento de salários e congelamento de preços, o sultão Qaboos bin Said al-Said nunca chegou a estar realmente ameaçado. Tido como um governante progressista que modernizou Omã, o sultão é amado pela maior parte da população – mesmo no auge dos protestos, surgiam cartazes entre os manifestantes com frases como “O povo ama seu rei” e “Somos fiéis a ti”.

Marrocos

MARROCOS

No começo do mês, um referendo aprovou por ampla margem a reforma constitucional proposta pelo rei Muhammad IV, que diminui a centralização do poder e aumenta as atribuições do parlamento marroquino. A nova constituição, porém, foi boicotada pelo Movimento 20 de Fevereiro, organização responsável pelos protestos que pedem democracia plena no país. Manifestações foram promovidas nos dias seguintes à votação, pedindo a mudança do regime para uma verdadeira monarquia constitucional, com diminuição efetiva dos poderes do rei. Além disso, pedem um efetivo combate à corrupção e medidas para uma melhor distribuição de renda. Apesar das mudanças, a nova constituição mantém o exército sob o comando do rei e consolida o monarca como autoridade máxima do Marrocos, tanto do ponto de vista político quanto religioso.

Iêmen

IÊMEN

O país foi palco de alguns dos mais violentos protestos do mundo árabe – em uma ação dos revoltosos, o presidente Ali Abdullah Saleh sofreu queimaduras e foi forçado a ir até a Arábia Saudita para tratamento. O governante, que comanda o Iêmen há 32 anos, ainda não retornou ao país, que é comandado interinamente pelo vice Abd al-Rab Mansur al-Hadi. Durante a ausência de Abdullah, forças governamentais e rebeldes concordaram com um cessar-fogo, mas a tensão continua. Ações militares, apoiadas por milícias tribais, tentam retomar cidades atualmente em poder dos rebeldes, o que já provocou centenas de mortes. Enquanto países árabes tentam negociar uma renúncia, forças de oposição anunciam a criação de um Conselho Nacional das Forças da Revolução, pretendendo comandar um regime transitório e garantir a saída definitiva de Ali Abdullah Saleh.

Jordânia

JORDÂNIA

Uma manifestação no último dia 15, ocorrida na capital Amã, foi reprimida com violência pela polícia, provocando ferimentos inclusive em jornalistas de agências como a France Press. Foi o momento mais violento nas ruas da Jordânia desde março. Segundo o ministro de Interior da Jordânia, Mazen Saket, os manifestantes tinham “planos de derrubar a monarquia”. Os revoltosos pedem uma reforma política e a redução dos preços dos alimentos, além de aumento de vagas de emprego e o combate à corrupção. Há também a exigência de que mude o processo de escolha do primeiro-ministro, indicado atualmente pelo rei Abdullah II.

Bahrein

BAHREIN

O Wefaq, principal movimento de oposição da maioria xiita, resolveu no último domingo (17) abandonar o fórum de diálogo nacional que busca encontrar uma solução para a crise institucional no Bahrein. A decisão, aprovada na segunda-feira pelo conselho consultivo do órgão, disse que o governo do rei Hamad Ben Isa al-Khalifa não está disposto a um “diálogo sério”. O Wefaq exige uma mudança de modelo político, com o abandono da monarquia constitucional em nome de um regime presidencialista. A repressão do governo sunita aos manifestantes da maioria xiita é violenta, levando até mesmo o Humans Rights Watch a manifestar-se pedindo a libertação de médicos e enfermeiras aprisionados pelas tropas leais ao rei. Ao todo, 33 pessoas teriam sido mortas durante os protestos que iniciaram em fevereiro, ainda que grupos de oposição garantam que o número é maior. Para alguns setores, o rei al-Khalifa é um reformista, tendo modernizado o Bahrein e assegurado os direitos das mulheres no país; outros setores, contudo, listam acusações contra o monarca e seu regime, indo de enriquecimento ilícito e discriminação até supostos atos de violação dos direitos humanos.

Arábia Saudita

ARÁBIA SAUDITA

O regime do rei Abdullah bin Abdul Aziz al-Saud, considerado uma das monarquias mais severas do mundo, vem obtendo aparente sucesso em controlar os focos de revolta popular na Arábia Saudita. O método saudita de controle de revoltas equilibra a mão pesada da guerra com a generosidade financeira do maior produtor de petróleo do mundo. Além de inviabilizar rapidamente os protestos que eclodiam em cidades como Qatif, Hofuf e Awwamiya, o governo saudita enviou tropas para o vizinho Bahrein, ajudando o rei al-Khalifa em seus esforços de manter o poder. Por outro lado, dezenas de milhões de petrodólares estão sendo injetados pelo rei na economia do país, não apenas para promover aumentos salarias, mas também em programas educacionais e incentivo a empreendedores. Por enquanto, não há sinais claros de uma revolta mais intensa na Arábia Saudita – ainda que a falta de medidas a médio e longo prazo indique que as causas da revolta continuam atuando sobre o povo saudita, o que pode levar a novos protestos no futuro.


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