Foto: Luiza Castro/Sul21
6 de novembro de 2023
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14:32

Entenda como mapeamos os projetos especiais que mudaram Porto Alegre nos últimos 10 anos

"Donos da Cidade" analisa ainda as relações entre o poder público e o setor privado que vêm modificando o planejamento urbano da Capital
Por
Lidiane Blanco
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O especial “Donos da Cidade” é um projeto do Sul21 que busca explicar como os interesses das grandes construtoras interferem e encontram eco na Prefeitura para construir a Porto Alegre dos anos 2020.

Por meio da análise de dados públicos, decretos e pesquisas acadêmicas, mapeamos os empreendimentos construídos ou aprovados para construção em Porto Alegre nos últimos dez anos (2012-2022). Este mapeamento é acompanhado de uma série de reportagens que busca debater os efeitos da instalação de mais de uma centena de megaprojetos arquitetônicos identificados e como isso se relaciona com a transformação social, em meio ao atual cenário de revisão do Plano Diretor.

Neste esforço, cruzamos os dados de três planilhas fornecidas pela Administração Municipal com a relação dos empreendimentos aprovados e licenciados, bem como a lista de projetos prioritários contemplados pelo Decreto 20.655 de 2020, Expediente Único (site com acesso público que concentra informações sobre processos em tramitação) e Termos de Compromisso (contrato que estipula as obrigações do Município e empreendedor). Dados obtidos via Lei de Acesso à Informação, escrituras de compra e venda registradas em cartório e relatórios das construtoras mais atuantes na Capital também serviram de base para identificar as novas edificações.

O ponto de partida foi a tese da pesquisadora e doutora em Geografia Júlia Ribes, que analisou os Projetos Especiais de Impacto Urbano de 2º Grau implementados na Capital entre 2010 e 2019. Estes projetos são definidos no Anexo 11 do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (Lei Complementar 434/99) como proposta de atividade ou empreendimento de grande porte, que exige análise diferenciada em razão do grau do impacto gerado. Por esse motivo, a empresa proponente assume obrigações que demandam a execução de ações de mitigação e compensação (obras e serviços), que são firmadas em termo de compromisso entre empreendedor e município.

O Plano Diretor ainda prevê outros dois tipos de projetos especiais: os de 1º grau, de menor impacto, como edificações de médio porte e casos como garagens comerciais com 100 a 200 vagas (que não geram termo de compromisso), e os de 3º grau, aqueles que envolvem operações urbanas em grandes áreas da cidade e exigem leis próprias – este último nunca realizado em Porto Alegre.

Esse levantamento resultou em um conjunto de 114 Projetos Especiais que estão distribuídos no mapa interativo identificados pelo nome do empreendimento, empresa responsável, bairro onde está localizado, estágio da obra e tipo de atividade. Optou-se por destacar os projetos cuja construtora tinha mais de cinco empreendimentos aprovados no município, dado que ajudou a identificar a concentração de licenciamentos edilícios em poucos grupos econômicos.

No mapa também é possível explorar em Projetos em Destaque, os casos mais emblemáticos da cidade que contam a história de cada um deles até a inauguração. Entre eles estão, Arena do Grêmio, Pontal e Golden Lake.

Apesar do esforço de pesquisa em múltiplas fontes, não foi possível precisar a quantidade exata de novas edificações – devido às informações desencontradas fornecidas pela Prefeitura – ou saber integralmente se os empreendedores entregaram as obrigações firmadas em contrato, pois esses documentos não estão disponíveis para consulta pública.

A Procuradoria-Geral do Município – órgão responsável pela elaboração do termo de compromisso e monitoramento das obras – não forneceu as comprovações solicitadas pela reportagem. Além da falta de transparência na gestão dos projetos especiais, muitas vezes não foram obtidas explicações na consulta aos órgãos da Administração Municipal.

O mapa interativo permite ao leitor visualizar o processo de transformação em andamento na cidade. Contudo, o especial não se encerra por aí. Ao longo da última década, o Sul21 vem fazendo, diariamente e em conteúdos especiais, um grande esforço de reportagem para explicar o impacto dos processos urbanos na vida da cidade.

Em 2017, publicamos o especial “Gentrificação”, sobre a contínua remoção de comunidades vulnerabilizadas para as periferias de Porto Alegre. Em 2021, foi a vez do especial “Que Porto é Esse?”, que discutia os rumos propostos para a cidade na intersecção entre os governos Marchezan e Melo. O “Donos da Cidade” é mais um esforço de debate, agora focado em como o interesse imobiliário se articula com o poder público para moldar o futuro de Porto Alegre.

O modus operandi político-empresarial para licenciamento e mudanças na legislação que favorecem os grandes empreendimentos são temas de duas matérias deste especial, em que destacamos casos específicos de projetos que não poderiam deixar o papel sem que regramentos urbanísticos vigentes, e válidos para todos os empreendedores interessados em construir na cidade, fossem mudados.

Além disso, uma reportagem destaca como a habitação de interesse social vem sendo deixada de lado nos grandes projetos de “revitalização” da cidade, como os que ocorrem no Centro Histórico e no 4º Distrito, mesmo com o discurso oficial prometendo aproximar todos os moradores das regiões centrais. Para quem é esta Porto Alegre em construção? Uma matéria do especial busca ainda explicar como a construção das cidades modernas não são mais encaradas sob o ponto de vista dos interesses de seus moradores, mas, sim, voltadas para a valorização de imóveis como ativos financeiros. Por fim, o especial é concluído – momentaneamente – com uma reportagem que busca articular todos estes temas com as discussões em andamento para a revisão do Plano Diretor da cidade.

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