O impacto econômico da disputa pela cidade: quem ganha e quem perde?
25 de julho de 2021
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09:14

O impacto econômico da disputa pela cidade: quem ganha e quem perde?

Financeirização do mercado imobiliário, desvirtuamento de projetos especiais e contrapartidas que beneficiam o próprio empreendimento no rol de problemas
Por
Luciano Velleda
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“Tenta investigar se há levantamento de demanda para 19 torres do lado do Barra (Shopping). Não tem.”

A afirmação de Eber Marzulo, mestre e doutor em Planejamento Urbano e Regional, se refere ao empreendimento Golden Lake, em obras na Avenida Diário de Notícias, zona sul de Porto Alegre. São 19 torres na área antes pertencente ao Jockey Club, de frente para o rio Guaíba.

Com o marketing de ser o “primeiro bairro privativo de Porto Alegre”, o empreendimento promete resgatar a “vida de bairro”, com vizinhança conhecida, “crianças livres e pais despreocupados”. Ao todo, o projeto é concebido em sete condomínios interligados, compondo os 19 prédios do bairro planejado com lagos, praia artificial, quadras de tênis poliesportivas, campo de futebol e muitas piscinas.

O Lake Victoria, com quatro torres, será o primeiro a ficar pronto. Um dos prédios terá oito andares, um imóvel por andar, com apartamentos de 543m² e a cobertura duplex com o total de 868m². Cada varanda com sua própria piscina aquecida e sauna.

A suspeita sobre a demanda para ocupar tantos novos imóveis em localização privilegiada da Capital pode causar estranheza no cidadão não familiarizado com o mercado imobiliário. Todavia, para o professor do Departamento de Urbanismo da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) não há dificuldade em compreender possíveis interesses menos óbvios de um empreendimento desse porte. A resposta para sua afirmação, ele explica, está na financeirização do mercado imobiliário. Um fenômeno mundial conhecido e cada vez mais presente em Porto Alegre e no Rio Grande do Sul.

A lógica em obter lucro com a construção de apartamentos de luxo, mesmo que muitos não sejam vendidos ou ocupados, deve-se aos interesses dos fundos de investimento por trás de muitos empreendimentos imobiliários. Esses fundos usam os empreendimentos como portfólio e o lucro provém da permanente valorização do negócio, mais do que da simples venda dos imóveis.

“Quem compra imóvel de dois milhões na beira de um lago em Xangri-Lá?”
“Em geral, não é mais como era antes ou como é nesses investimentos mais em área central, de procurar atender a uma demanda”, explica Marzulo. “Interessa para esses fundos que mexem com muita grana, grandes investimentos. Agora, eles não estão preocupados porque não vão ganhar na venda do imóvel, vão ganhar na valorização daquela área. Então eles vão construir, aquela área vai ser valorizada. O que está interessando é a valorização do bem como portfólio para os fundos de investimento, porque ele vai captar recursos no exterior.”

Marzulo explica que os fundos usam esses empreendimentos em diversas partes do mundo como garantia, como portfólio para investidores, considerando a permanente valorização dos terrenos. “O fundo pega esse dinheiro e tem que esparramar esse dinheiro pelo mundo, uma das coisas em que ele esparrama é montando o próprio portfólio.”

Do ponto de vista da cidade, analisa o urbanista, a consequência é a desarticulação entre o investidor imobiliário, a construção civil e a demanda. Na prática, muitos imóveis de luxo ficam prontos e nem são ocupados mesmo estando vendidos — e às vezes revendidos mais de uma vez. “Eles são poucos, mas têm muito dinheiro. Quem é que compra um imóvel de dois milhões na beira de um lago em Xangri-Lá? É o cara que precisa investir, esse cara tem que gastar o dinheiro. Gastando, eles fazem o dinheiro girar.”

Fabian Domingues, professor de economia da UFRGS, também destaca a financeirização por trás do mercado imobiliário, com o uso de imóveis como ativos econômicos e garantidores de operações financeiras, como um problema atual do urbanismo da cidade. Ele afirma que esse é o mecanismo pelo qual os especuladores financeiros com ativos em imóveis não têm interesse em desvalorizar ou fazer uma oferta com valor menor dos seus imóveis. É a explicação para preferir deixar um apartamento vazio ao invés de alugá-lo por valor mais baixo.

“Depois que esses fundos investiram milhões em grandes imóveis, prédios de luxo e shoppings, sabe o que eles não podem fazer? É baixar o preço, porque o fundo é determinado pelo preço do bem e não pelo preço do aluguel do bem. Então se o apartamento de 800 está fechado há cinco anos, mas o valor de venda dele não mudou, o fundo continua apropriando no seu balanço aquele valor”, explica.

Ao lado do Barra Shopping, Golden Lake deve ter 19 torres e apartamentos de luxo. Foto: Luiza Castro/Sul21

Uma característica marcante de grandes empreendimentos como o Golden Lake e outros é a proposta de serem condomínios vendidos como “bairros planejados”, que oferecem uma série de serviços de modo a passar a sensação de segurança e comodidade. O marketing de venda é baseado na ideia do conforto de quase nem ser preciso cruzar os muros do condomínio. Se para muitos a proposta parece atraente, para a cidade tal concepção de grandes áreas fechadas pode causar problemas.

“Quando se diz que Porto Alegre é uma cidade restritiva, eu digo: mentira”
Presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil no Rio Grande do Sul (IAB-RS), Rafael Passo pontua que muitos projetos voltados à classe média e média alta acabam descaracterizando a cidade e indo contra os princípios e diretrizes do Plano Diretor. Como exemplo já pronto, cita o Central Park, conjunto de condomínios residenciais construído nas proximidades da Avenida Ipiranga. Também com o conceito de bairro planejado, é cercado por grades, com estabelecimentos comerciais do lado de dentro do condomínio, mas inacessíveis para quem está fora.

Para o arquiteto, esse tipo de empreendimento vai contra os princípios e diretrizes do Plano Diretor, como a priorização ao pedestre, o conceito da cidade mista e caminhável, com comércio acessível à pé e que favorece o uso do transporte público.

“É um bairro que não é um bairro do século 21. Não é um bairro que deveria estar instalado em uma cidade que diz assinar uma agenda urbana internacional que é exatamente o contrário. Isso é sintomático do quanto o nosso planejamento está entregue à tomada de decisão, praticamente qualquer que seja, do empreendedor. Quando se diz que Porto Alegre é uma cidade restritiva, eu digo: mentira. Se ela fosse restritiva e seguisse seus objetivos, muitos dos empreendimentos não poderiam estar sendo mais implantados aqui e estaríamos em situação melhor”, afirma.

Eber Marzulo, professor da Faculdade de Arquitetura da UFRGS, acredita que a cidade tem boas possibilidades. O problema é a articulação entre o capital imobiliário e o governo, que favorece a construção de grandes áreas fechadas em si próprias, que prejudicam a ideia da cidade como o lugar em que os diferentes se encontram e esse encontro permite um processo de criação, inclusive socioeconômico.

O especialista em planejamento urbano explica que esses projetos são cada vez mais concentrados e volumosos. Aquele pequeno investidor de outrora, que constrói edifícios para alugar e vender apartamentos, vai perdendo espaço para o capital financeiro, mais interessado em grandes projetos, como shoppings, condomínios e os ditos “bairros planejados”. A lógica dos grandes empreendimentos, ele ressalta, é prejudicial inclusive para a economia urbana.

“Tende a gerar áreas com pouca utilização e com muita infraestrutura, e tende a puxar uma infraestrutura para áreas mais distantes. Imagina as modificações, os investimentos públicos, em termos da infraestrutura, para dar conta de 19 torres numa área em que moravam algumas famílias, em unidades familiares, cuidando de cavalos, com baixo impacto, em volta daquele córrego que sai no Guaíba, para um projeto de impacto ambiental e custo econômico geral muito grande, com efeitos negativos. Tu vais levar população para aquela área, então vai ter aumento de custo de eletricidade, água, esgoto, canalizações, transporte público, transporte privado. Se forem ocupadas 19 torres, vai ter um volume de mais automóveis naquelas ruas. Quer dizer, não vai ser legal para quem mora na zona sul e para a cidade como um todo”, afirma Marzulo.

Coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Economia Urbana (NEPEU) da UFRGS, Fabian Domingues concorda e diz que muitos desses projetos têm a característica de serem empreendimentos que “negam a cidade”, ou seja, oferecem uma série de serviços para que o proprietário pouco precise sair à rua.

Domingues pondera que a legislação já abrange os conceitos de uma cidade inclusiva, o problema é que não é obedecida. “Do ponto de vista do Plano Diretor, não tem que mudar nada. O drama é que não é cumprido, não é obedecido, e se criam exceções e flexibilizações”, afirma.

Sinaleira como contrapartida é apontada como “vício de compreensão” por especialistas. Foto: Luiza Castro/Sul21

Nos últimos anos, os grandes projetos imobiliários na Capital têm se aproveitado de uma brecha na legislação para driblar o Plano Diretor e serem aprovados. Denominados de “projetos especiais”, passam por tramitação diferenciada no Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (CMDUA), analisados caso a caso. Com o tempo, o que era para ser exceção, virou a regra.

“Tudo aquilo que é terra e pode ser comercializado, acaba sendo em detrimento de todos os demais”
Marzulo defende que a regra dos projetos especiais precisa ser revista no Plano Diretor. A excepcionalidade se tornou o comum; e o que era comum foi desaparecendo. “Os efeitos foram perniciosos ao longo dessas duas décadas, porque se tornou uma janela de oportunidade e, absolutamente adequada, e aí tem uma certa coincidência, a forma como o capital fundiário e imobiliário passa a atuar no século 21. Isso não tava no horizonte”, explica, lembrando o contexto do mercado imobiliário há algumas décadas.

“Quando foi pensado o projeto especial, não tinha esse capital atuando dessa maneira. Então, grandes projetos seriam pouco pensados à luz dos anos 1990. É um plano de 2000, pensando no mundo dos anos 1990. E aí se tornaram a regra, por essa dinâmica do capital geral e como ele se realiza na cidade. E aí, no caso, a legislação de Porto Alegre cai como uma luva, mas eles dão um jeito em qualquer plano”, afirma.

Na esteira da aprovação dos grandes empreendimentos como projetos especiais, vem também a disputa em torno das contrapartidas — melhorias que o empreendedor deve fazer na cidade para mitigar o impacto do projeto.

Fabian Domingues, professor de economia da UFRGS, considera a legislação confusa e diz não entender os critérios de contrapartida e medidas mitigatórias a partir dos termos de compromisso, dando margem para que o próprio investidor diga qual será a contrapartida. Estudo feito na UFRGS se deteve nos projetos especiais de segundo grau e seus impactos urbanísticos na cidade. Na prática, diz ele, as contrapartidas acabam sendo usadas para beneficiar o próprio empreendimento.

Como exemplo, Domingues cita a sinaleira com conversão à esquerda na avenida Diário de Notícias, no sentido centro-bairro, permitindo dobrar para entrar no Barra Shopping Sul. A sinaleira não precisaria existir se não houvesse o shopping. “E eles fazem isso como contrapartida”, enfatiza. “Há um vício de compreensão original do que sejam as contrapartidas.”

Obras viárias no entorno e drenagens também costumam entrar como contrapartidas e medidas mitigatórias, na prática beneficiando o próprio negócio e, assim, tirando do empreendedor a necessidade de investir na cidade.

Em outro exemplo, Domingues destaca a situação do trânsito na avenida Anita Garibaldi. Cada empreendimento apresenta o estudo de impacto no trânsito do seu negócio, porém, a Prefeitura não analisa o impacto geral de todos os empreendimentos somados e que vão se acumulando na avenida.

“O cálculo devia ser feito a partir da capacidade total da via, e à medida que essa capacidade for se esgotando, vai se perdendo a permissão”, afirma o coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Economia Urbana da UFRGS. “No fundo, é a visão de que o mercado impera. Tudo aquilo que é terra e pode ser comercializado, acaba sendo em detrimento de todos os demais. O pessoal quer ganhar dinheiro com aquele pedaço de terra e não tem essas preocupações, não está no horizonte deles, não acham que isso seja problema.”

Domingues e outros pesquisadores da UFRGS têm se debruçado sobre o tema dos projetos especiais. A avaliação aponta para a “completa deturpação” do instrumento. Uma tese de doutorado sobre os usos e o financiamento dos projetos especiais em Porto Alegre mostra que as contrapartidas e medidas mitigatórias previstas na legislação são muito baixas em relação ao investimento total do projeto. Um projeto de R$ 100 milhões, por exemplo, teve como contrapartida a colocação de lixeiras na frente do empreendimento.

“Em dez anos de levantamento das contrapartidas, cerca de R$ 40 milhões foram dados pelos grandes empreendimentos para obras na cidade”, afirma o professor.

Para Eber Marzulo, especialista em planejamento urbano, é preciso pulverizar o mercado, que hoje segue as possibilidades oferecidas pela legislação. Foto: Luciano Lanes/Arquivo PMPA

O vereador Roberto Robaina (PSOL) é taxativo ao afirmar que as contrapartidas devem ter interesse social. Prioritariamente em forma de habitação e não em construção ou manutenção de praças, como costuma acontecer. Ele lembra que o Golden Lake, ao lado do Barra Shopping, propõe realizar melhorias no trecho da Orla do Guaíba em frente ao empreendimento como contrapartida às 18 torres do projeto. Na prática, a contrapartida valorizará o próprio negócio.

Robaina explica que, na Câmara, as discussões sobre contrapartidas têm ocorrido caso a caso e não de modo geral. O vereador lembra do Central Park, na Vila Bom Jesus, cuja mobilização da comunidade levou a um processo de negociação que, ao fim, evitou despejo de moradores locais. Na época, a proposta da Rossi, empreendedora do projeto, era oferecer uma praça como contrapartida.

“Ali foi onde se colocou o discurso de que a contrapartida tem que ser moradia popular, porque o despejo seria a negação dessa contrapartida”, explica. “As pessoas não querem praça de contrapartida, querem moradia.”

O vereador do PSOL diz que o caso da Bom Jesus foi uma vitória da mobilização popular. Ele ressalta, porém, que às vezes a mobilização não é suficiente e é preciso recorrer à Justiça. “Foi o melhor exemplo de luta, na prática, por política urbana diferente. Foi um enfrentamento em que a Rossi teve que ceder.”

Financeirização do mercado imobiliário, desvirtuamento dos projetos especiais, e contrapartidas que beneficiam mais o próprio empreendimento do que as carências da cidade. Qual a saída desse cenário adverso?

“O caminho não é fechar, murar e isolar, é ter a integração do público com o privado”
Para o professor Eber Marzulo, especialista em planejamento urbano, é preciso pulverizar o mercado, que hoje segue as possibilidades oferecidas pela legislação. Ele defende a  criação de condições jurídicas legais e também impeditivas que orientem os investimentos. “O presidente do Sinduscon pode dizer, como cidadão, que não é legal. Mas, como empresário, ele vai para onde está a oportunidade de maior ganho”, analisa.

Como exemplo, Marzulo sugere investimentos na área central, nos muitos prédios vazios e antigos da região. Sua ideia é a criação de um imposto decrescente para quem usar os prédios-garagem na avenida Mauá, criando ali habitação social ou para a classe média, de frente para o rio, no meio do Centro, com fácil acesso por aplicativo, transporte coletivo ou de bicicleta. “Não é tão difícil de imaginar. Tem muito prédio vazio na Mauá.”

Germano Bremm, secretário de Urbanismo, Meio Ambiente e Sustentabilidade de Porto Alegre, concorda que a lógica do mercado imobiliário está na contramão da “cidade do século 21”.

O secretário avalia que o cenário tem mudado lentamente e que há empresários com projetos alinhados àquilo que é o entendimento da Prefeitura e do que ele chama de “urbanismo contemporâneo”, cujos pressupostos são a integração do público com o privado e a fachada ativa.

Ele acredita que o próprio mercado imobiliário começa a qualificar os projetos com essa integração, conforme a sociedade demanda. “O caminho não é fechar, murar e isolar, é aproximar e ter a integração do público com o privado, isso é mais vitalidade pro espaço público e mais segurança.”

Professor defende transformar os armazéns em polo de atividades e serviços culturais ligados à economia criativa. Foto: Luiza Castro/Sul21

Apesar da correnteza favorecer os grandes empreendimentos e condomínios murados, há exemplos em sentido contrário na cidade. Eber Marzulo, professor do Departamento de Urbanismo da Faculdade de Arquitetura da UFRGS, cita casos de prédios miscigenados na região central e em bairros da zona sul, como Tristeza e Cristal. Em edifícios antigos no Bom Fim e na Cidade Baixa, construídos nos anos de 1950, 60 e 70 sem espaço para comércio no térreo, hoje se vê que uma porta foi aberta para abrigar um pequeno negócio.

O especialista em planejamento urbano se detém no caso do Cais Mauá como um espaço com potencial para diversos usos econômicos. Possibilidades bem diferentes do modelo que ainda tem como referência o Puerto Madero, em Buenos Aires, um empreendimento dos anos 1990 que muitos querem replicar em 2021.

“O pequeno comércio incentiva uma cidade em que as pessoas caminham na rua.”
Marzulo conta que os projetos mais recentes de grandes blocos de edifícios e que, por transformações econômicas ficaram áreas disfuncionais — sendo ou não à beira de rios —, são de reutilização dessas áreas para produções econômicas ligadas à cultura e economia criativa. Principalmente em regiões centrais.

“Por quê? Porque ela precisa da infraestrutura, ela não gera impacto e permite uma circulação pública muito grande. Então, por exemplo, transformar os armazéns em polo de atividades e serviços culturais ligados à economia criativa, articulando atividades de alto impacto intelectual, cultural, de constituição de um projeto de sociedade, teatro, literatura, que são também cadeias econômicas importantes, chegando até as duas que são de maior peso, a de gamers e do audiovisual, particularmente a produção para cinema, para séries e para TV”, explica o professor do Departamento de Urbanismo da Faculdade de Arquitetura da UFRGS.

Numa cidade como Porto Alegre, polo cinematográfico reconhecido por abrigar grandes produtoras, as possibilidades seriam muitas. O próprio Cais Mauá já foi testado para abrigar o Museu de Arte Contemporânea (MAC), a Bienal de Artes Visuais e a Feira do Livro. O uso pode ser inclusive misto, ao combinar estruturas permanentes com armazéns para atividades eventuais, proporcionando movimentação na área.

As possibilidades de comércio local nos bairros são igualmente analisadas pelo professor de economia Fabian Domingues. A discussão toda se refere ao modelo urbano que se pretende: se o mais europeu, com cidades afeitas ao pedestre e incentivo ao pequeno comércio; ou o padrão de urbanização americano, voltado aos grandes empreendimentos na região central da cidade e que privilegiam o uso do transporte individual.

“O pequeno comércio incentiva uma cidade em que as pessoas caminham na rua. O shopping e os grandes empreendimentos privilegiam o automóvel, haja vista os espaços de estacionamento que eles colocam. Isso muda o sentido do deslocamento e coloca a turma no circuito do ar-condicionado. Como gostam de falar os investidores, ‘muda o padrão’”, explica o coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Economia Urbana da UFRGS.

Domingues alerta que o padrão americano, ainda incentivado em Porto Alegre, está em decadência em outros lugares do mundo, inclusive nos Estados Unidos. Ele acredita que essa decadência uma hora chegará na capital gaúcha. A questão é quando e qual impacto terá causado. Ou se o movimento pela revitalização dos bairros e do comércio local mudará antes essa trajetória.

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