Opinião
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12 de novembro de 2021
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08:20

Quando não querem nos ouvir de verdade… (por Jaques Guimarães Schaefer)

As  aulas de Filosofia estão presentes para os alunos de várias escolas particulares hoje, no ensino fundamental. (Foto: Simpa/Divulgação)
As aulas de Filosofia estão presentes para os alunos de várias escolas particulares hoje, no ensino fundamental. (Foto: Simpa/Divulgação)

Jaques Guimarães Schaefer (*)

No dia 10/11/21, recebemos a secretária da Educação de Porto Alegre, Janaína Audino, em uma das escolas onde trabalhamos, na EMEF Judith Macedo de Araújo.

A secretária viria junto ao Prefeito Sebastião Melo para fazer uma entrega simbólica de cestas básicas, junto à direção, aos representantes do CMA (Conselho Municipal de Alimentação) e aos setores da agricultura familiar da nossa comunidade escolar.

Lembramos, então, de toda o processo de retirada arbitrária da Filosofia dos currículos das escolas de Porto Alegre feito pela Secretaria da Educação neste ano, e da proposta de uma grade curricular intempestiva, com falso consenso, definida pela gestão do Melo e liderada pela Secretária da Educação, Janaína Audino. Recordamos também as vezes em que a secretária disse que receberia os conselhos escolares e outros representantes das escolas de Porto Alegre descontentes com essas mudanças. A secretária, porém, desmarcou a maioria dos encontros ou, nas poucas vezes que concordou com as reuniões, mandou apenas assessores.

Esses sempre pareciam estar nas reuniões com uma determinação prévia: “Ouçam, mas estejam certos: tiraremos a Filosofia como está hoje. Dialoguem, mas o ‘consenso final’ será minha decisão única: Não manteremos a Filosofia para os alunos da Rede Municipal de Ensino na grade curricular”

Pensamos, então: “Aqui uma oportunidade da Secretária nos ouvir, de ouvir a todos…”

Como os nossos alunos sabem da importância das aulas de Filosofia e do modo arbitrário que a secretária tem levado essa nova grade curricular às escolas, perguntamos se eles gostariam de falar com ela, já que a Secretária da Educação, junto com o prefeito, estariam na nossa escola. (Soubemos depois que o prefeito Sebastião Melo não viria).

Todos os alunos que estavam na escola e tinham aula de Filosofia conosco propuseram-se a descer e pedir pela permanência das aulas da matéria. Gritos de “Fica Filosofia” foram ouvidos pelos corredores da escola e a secretária teve mais um dos vários sinais, agora bem próximo, do efeito de medidas tão impopulares e funestas como essas para os nossos alunos. Com efeito, toda a nossa escola foi tomada pelos gritos “Fica Filosofia!”

Depois, solicitei a secretária que, se pudesse, aproveitasse a oportunidade de conversar comigo e alguns representantes de nossos alunos. Ela aceitou e, sobre o amparo da nossa escola, os alunos poderiam indagar sobre o porquê de serem impostas essas mudanças.

Foi surpreendente ver a disposição dos três alunos escolhidos para conversar com a secretária. Ela buscou dizer que a Filosofia estava “concretizada” como fora da “Base Nacional Comum Curricular”. A BNCC é uma política curricular para o ensino no País. Os alunos questionaram que tinham amigos e conhecidos de escolas particulares que tinham essa matéria e que ela não seria retirada dessas escolas. Pensamos: “A BNCC só concretiza a retirada da Filosofia dos pobres ou daqueles que não têm como pagar por ela, numa escola particular?”

A BNCC obviamente não impede a Filosofia, pois suas aulas estão presentes para os alunos de várias escolas particulares hoje, no ensino fundamental.

Ao ser confrontada com esses fatos, a secretária Janaína não conseguiu convencer os nossos alunos que lutavam bravamente para serem realmente escutados na sua busca pela permanência das aulas de Filosofia como são dadas na nossa escola. Disse que “não poderia agradar a todos”. Sugeriu um “espaço filosófico”, que, na verdade, tira o professor de Filosofia desse momento de dar aula mesmo, deixando de lado a garantia de que a Filosofia continue seu trabalho de formação humana na Rede Municipal de Ensino de Porto Alegre.

No fim, a secretária levantou-se e finalizou o “diálogo”, deixando sensação de injustiça e autoritarismo entre todos que a escutavam. Arrisquei oferecer que ela assistisse uma de nossas aulas de Filosofia antes de decidir por sua retirada. Ela, porém, já havia decidido e o falso diálogo se encerrou.

(*) Professor de Filosofia da Rede Municipal de Ensino de Porto Alegre

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