Opinião
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31 de agosto de 2020
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19:24

A Rede de Orgânicos de Osório celebra 4 anos de vida no Litoral Norte (por Eduardo Luís Ruppenthal e Fernanda Bobsin Dai-Prá)

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Sul 21
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Eduardo Luís Ruppenthal e Fernanda Bobsin Dai-Prá (*)

Agosto é o mês que celebramos mais um ano de atuação da Rede de Orgânicos de Osório. Surgida a partir das reflexões sobre a produção de alimentos sem o uso de agrotóxicos no meio rural, fortalecimento da agricultura familiar, valorização do agricultor orgânico e da forma como estes alimentos podem chegar aos consumidores urbanos sem intermediários.

Reflexões acima que nos levam a questionar a insustentabilidade social e ambiental do modelo agroalimentar hegemônico. Além de sua prioridade para a produção de comoditties agrícolas para a exportação, baseado no uso desenfreado de agrotóxicos, sendo muitos destes proibidos nos países de origem e até no Brasil, mas usados amplamente, tornando o país como um dos que mais usam esses venenos no mundo.

Divulgação

Há amplas evidências científicas das diversas consequências à saúde da população. Entre estes, citamos o fato de serem cancerígenos, colocando em risco a saúde tanto de quem produz quanto de quem consome. Como consequência ambiental, mencionamos a forma de produção, que ocasiona inúmeros impactos negativos, como a destruição de ecossistemas e habitats, fauna e flora e redução da biodiversidade, para a ocupação com áreas de pastagens e monoculturas.

Todos os seis biomas brasileiros – Pampa, Mata Atlântica, Caatinga, Cerrado, Amazônia e Pantanal – estão sendo impactados por esse modelo. Neste momento, destacam-se as queimadas e desmatamento que estão sofrendo os três últimos biomas citados acima, literalmente “em chamas”.

Este modelo reflete uma dieta alimentar cada vez mais homogênea, baseada em poucas espécies e alimentos que percorrerem milhares de quilômetros, viciados em petróleo, pobres em nutrientes e que na sua forma de produção podem causar inúmeros impactos negativos já mencionados.

Como alternativa a esse modelo, que tem a sua origem recente, no período pós-segunda Guerra Mundial, com a introdução dos agrotóxicos, (res) surgem várias outras. Alguns existentes desde os primórdios da agricultura realizada pela humanidade e outros que estão sendo construídos por milhões de agricultoras e agricultores pelo mundo afora. E além de resistir, a (s) agricultura (s) alternativa (s) estão em pleno crescimento, tanto no Brasil e no mundo.

A Rede de Orgânicos de Osório é uma experiência de cadeia produtiva curta, que aproxima os produtores e os consumidores, surge e contribui na organização desse canal de comercialização direta, encurtando o caminho dos alimentos e trazendo vantagens para todos: econômicas, sociais, culturais e ambientais.

Um dos pontos principais a serem considerados é a saúde coletiva, de quem produz e de quem consome, além da saúde do meio ambiente. Neste formato de produção tem-se a preservação do solo, ar, água, fauna e flora que não são contaminados com o uso de agrotóxicos. Além disso, são fornecidos uma enorme diversidade de alimentos, de inúmeras espécies, com vasta quantidade de nutrientes, necessários e fundamentais para o funcionamento das relações biológicas do corpo humano e fortalecimento do sistema imunológico.

Os produtores da Rede de Orgânicos, assim como tantas outras experiências no Litoral Norte, além de plantarem para si, sua família, possuem como sustento a venda de dezenas de alimentos. Além de outros pontos de comércio, como feiras, surge uma outra possibilidade para o escoamento da produção: a Rede de Orgânicos de Osório.

Os produtos da rede inicialmente eram solicitados através de pedidos realizados via rede social whatsapp, em um projeto piloto iniciado com alunos da turma de Pós-Graduação Lato Sensu em Meio Ambiente e Biodiversidade da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS), unidade Litoral Norte, localizada em Osório.

A entrega dos produtos era feita na unidade da universidade durante o período de realização do curso, por agricultores e consumidores. Concomitantemente ao grupo da UERGS, a Rede de Orgânicos ia agregando outros consumidores interessados que retiram suas cestas na Feira dos Produtores de Osório.

A rede de orgânicos vem se expandindo, em relação ao número de agricultores que hoje fazem parte do grupo, aos consumidores que vem agregando, ao seu alcance, ao seu formato e as parcerias que vem tecendo.

Atualmente os pedidos acontecem via site https://www.rededeorganicos.com.br, fruto de um projeto de extensão do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS campus Osório). Em Osório, as cestas são montadas pelos agricultores e consumidores e retiradas pelos consumidores no Sindicato dos Trabalhadores Rurais (neste período da pandemia), nos sábados. As cestas também estão sendo entregues em Imbé e Xangri-lá (quartas-feiras) e contam com a colaboração de consumidores na entrega. Além do IFRS Campus Osório, outra parceria que tem colaboração acadêmica é  a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Campus Litoral Norte em Tramandaí).

Além de ser um canal de comercialização de alimentos orgânicos, sem agrotóxicos, a Rede tem o compromisso de valorização da alimentação saudável e da agricultura familiar, da saúde coletiva e da preservação ambiental dos ecossistemas relacionados ao Bioma da Mata Atlântica.

Neste sentido, também promove atividades diversas, atualmente suspensas devido à pandemia, tais como: rodas de conversa, cine debate, troca de sementes, oficinas e cursos de alimentação saudável, como o aproveitamento integral dos alimentos e uso de Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANC). Além destas ações, é realizada a integração com as aldeias indígenas e visitas dos consumidores às propriedades rurais, fortalecendo a confiança e a identidade, e o essencial: a troca de vivências e experiências entre mulheres e homens do campo e da cidade.

Destaca-se que a Rede que é um exemplo de auto-gestão a partir da tomada de decisão compartilhada entre os agricultores e os consumidores, já que há reunião semanal para decidir todas as questões e demandas que surgem. Um importante parceiro neste processo é a EMATER/RS-Ascar, que esteve junto desde o início da rede auxiliando no fortalecimento do trabalho.  Atualmente, as reuniões acontecem de forma online. Os produtores da Rede são integrantes da OPAC ou da ECOVIDA, sendo as duas certificações participativas.

A Rede tem muitos significados para todos. Não somos os únicos e há tantas outras maneiras de organização, fundamentais e necessários para o momento atual. Estamos no início da caminhada, feita de forma coletiva e por muitas mãos. Temos muitos desafios, tanto nossos, como também de ajudar na multiplicação de outras experiências.

Sabemos que não estamos sós e precisamos cada vez mais nos organizar, pensando na coletividade e na alimentação de verdade em nossas mesas. Em tempos de pandemia, de aumento de fome e desnutrição de milhões, onde poucos lucram muito e transformam os alimentos em mercadoria, que envenenam corpos, seres vivos e ambientes, esta reflexão é mais que necessária.

Ressaltamos o nosso compromisso com a alimentação saudável, a segurança e soberania alimentar, as sementes como patrimônio da humanidade, a Agroecologia, o fortalecimento da agricultura familiar, a valorização do agricultor, a saúde das pessoas e dos demais seres vivos e do nosso Planeta Terra. Nosso compromisso é com esta e com as futuras gerações. Em defesa da Vida! Vida longa à Rede de Orgânicos de Osório!

(*) Eduardo Luís Ruppenthal, consumidor, integrante da Rede de Orgânicos de Osório, biólogo, professor da rede pública estadual, especialista em Meio Ambiente e Biodiversidade (UERGS) e mestre em Desenvolvimento Rural (PGDR/UFRGS).

Fernanda Bobsin Dai-Prá, consumidora, integrante da Rede de Orgânicos de Osório, bióloga, consultora ambiental, especialista em Gestão Ambiental (Faculdade Dom Bosco) e especialista em Meio Ambiente e Biodiversidade (UERGS).

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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