Coronavírus
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5 de janeiro de 2022
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13:16

Porto Alegre inicia nova estratégia de testagem em meio a aumento de casos de covid-19

Por
Luciano Velleda
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O alto índice de vacinação da população tem contribuído para o não agravamento de casos clínicos na mesma medida do aumento de casos. Foto: Cristine Rochol/PMPA
O alto índice de vacinação da população tem contribuído para o não agravamento de casos clínicos na mesma medida do aumento de casos. Foto: Cristine Rochol/PMPA

Entra em vigor a partir desta sexta-feira (5), na capital gaúcha, uma nova estratégia de testagem de covid-19 elaborada pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS). O foco da ação consiste em investir na ampliação da oferta do teste rápido de antígeno, cujo resultado fica pronto em menos de 30 minutos. O objetivo da gestão municipal é ganhar mais velocidade no diagnóstico de pessoas contaminadas. Por outro lado, a nova estratégia prevê a redução da oferta dos testes de RT-PCR, considerado de “padrão ouro” e mais eficiente para detectar o vírus ativo no paciente, mas que leva em torno de 2 a 3 dias para se obter o resultado. 

A orientação é que pessoas com sintomas sejam submetidas ao teste de antígeno e, em caso de positivo, recebam atestado médico de 10 dias. A novidade é que se a pessoa estiver com sintomas, mas o resultado do teste for negativo, então ela será encaminhada para realizar o teste de RT-PCR em um dos oito locais onde o exame estará disponível – ICBS, US Álvaro Difini, US Paulo Ávila, US Navegantes, US Murialdo, US Morro Santana, US Ramos e US Moab Caldas.

A realização do segundo teste em pessoas sintomáticas deve-se a menor sensibilidade do teste de antígeno em comparação com o RT-PCR. A maior chance de haver resultado de falso negativo com o teste de antígeno é justamente a razão de algumas críticas à nova estratégia da Prefeitura.

Em meio a essa mudança, os primeiros dias de 2022 foram complicados para os porto-alegrenses que procuraram postos de saúde para a realização do teste de covid-19. A situação foi particularmente difícil nesta terça-feira (4) no posto Modelo, localizado no bairro Santana, e costumeiramente um dos mais movimentados da Capital. O motivo das longas filas e muitas horas de espera foi apontado como consequência da desativação, na última sexta-feira (31), da tenda que havia no local para atender pacientes com sintomas de covid-19. 

Sob condição de anonimato, um trabalhador de saúde do posto Modelo disse à reportagem do Sul21 que a desativação da tenda aconteceu de modo inesperado e sem explicação prévia aos funcionários. Com isso, a média diária de testes de covid-19 caiu de 150 para cerca de 40 testes. Esse fato aliado ao aumento da procura após as festas de final de ano e a circulação da ômicron, uma nova cepa do coronavírus mais contagiosa do que as anteriores, culminou com o represamento da demanda.

Segundo a Secretaria Municipal de Saúde (SMS), o encerramento da tenda do posto Modelo ocorreu devido ao fim do convênio com a entidade que prestava o serviço. O mesmo contrato também possibilitava com que os pacientes atendidos em outros postos da cidade com suspeita de covid-19 pudessem realizar o teste de RT-PCR em laboratórios conveniados.

Com o encerramento do convênio, a demanda por teste em outros postos da Capital também começou a sofrer represamento, justamente no momento em que Porto Alegre passa por um aumento de casos positivos e de uma possível nova onda, dessa vez causada pela variante ômicron. 

Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) informa que a ampliação da oferta dos testes rápidos de antígeno passarão de 33 para 60 unidades de saúde. A ampliação valerá já a partir desta sexta-feira (7), com a divulgação dos locais nos próximos dias. 

“O objetivo é qualificar o serviço oferecido a pacientes com sintomas de covid-19, isolando mais rapidamente os casos positivos da doença. Os pacientes sintomáticos e que tiverem resultado negativo no antígeno serão encaminhados para realização de teste RT-PCR para confirmação. Estes testes serão realizados em oito pontos mediante encaminhamento das Unidades de Saúde”, explica a SMS.

A nova estratégia da Prefeitura parece dividir opiniões. O trabalhador do posto de saúde Modelo, que prefere não se identificar para não sofrer represália, questiona a estratégia de substituir o teste de RT-PCR, considerado padrão ouro, por outro em que a chance de resultado falso negativo é maior. Também critica a orientação do segundo teste, este sim de RT-PCR, para os sintomáticos cujo teste de antígeno der negativo. A razão é que entre um teste e outro o indivíduo continuará circulando pela cidade e potencialmente contaminando outras pessoas. 

Para o trabalhador do posto Modelo, a nova estratégia irá dificultar o acesso da população mais vulnerável ao teste de RT-PCR. Outro fator apontado é que a insuficiente quantidade de profissionais na rede municipal de saúde pode afetar a intenção de agilizar o diagnóstico. Na prática, trabalhadores de saúde de outras áreas deverão ser deslocados para atuar na aplicação de testes, deixando descoberta outras áreas da atenção primária de saúde. 

O médico Eduardo Sprinz, chefe do serviço de infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) tem opinião distinta sobre a nova estratégia do governo municipal. Considerando o contexto da pandemia, ele avalia que o custo-benefício de aplicar um teste mais rápido e mais barato como política de testagem em massa pode ser melhor. “Neste momento de explosão de casos, é uma coisa adequada”, afirma.  

Sprinz diz que nem no pico da pandemia em 2021 viu tantos casos positivos como tem visto nos últimos 7 dias. Enquanto as outras variantes do coronavírus levavam em torno de 5 dias para iniciar os sintomas, a ômicron tem mostrado ser mais rápida, com sintomas já a partir do segundo dia do contágio.

A grande diferença do atual cenário, destaca o infectologista, é a vacinação. Mesmo com aumento de casos, os sintomas são mais leves, situação bem diferente da vivida nos primeiros meses de 2021, quando o Brasil sofreu com recordes diários de internações e mortes.

O chefe do serviço de infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre faz uma ressalva para a nova estratégia da Prefeitura: a qualidade dos testes de antígeno. Sprinz destaca ser preciso conhecer a origem para saber se é um teste confiável. “É um teste importante, mas temos que saber se foi validado ou não, saber qual a procedência e qualidade do teste”, pondera.

A ressalva de Sprinz deve-se justamente a questão da menor sensibilidade do teste de antígeno e o maior risco de um resultado falso negativo. O motivo é o mesmo pelo qual o vereador Jonas Reis (PT) critica a nova estratégia da Prefeitura. Para o parlamentar, é um erro reduzir a oferta de testes RT-PCR justo no momento de aumento de contaminação.

“Covid e influenza estão circulando muito rápido. Se o governo quisesse mesmo investir na saúde, deveria aumentar os testes de influenza e aumentar o RT-PCR”, avalia Reis. O aumento da oferta de testes de antígeno para influenza é igualmente defendido por Sprinz.

“O que falta é uma governança diante da nova variante que está vindo, eles não estão entendendo o que está acontecendo. Nesse momento precisamos ter precisão”, afirma Reis, projetando que os próximos 10 dias mostrarão uma explosão de novos casos.  

A concentração em apenas oito lugares da oferta do teste de RT-PCR para pessoas sintomáticas e com resultado negativo no teste de antígeno também é apontada como um equívoco pelo parlamentar. Reis diz que essa concentração vai afetar o deslocamento da população, principalmente dos mais pobres.

Nesta terça-feira (4), o parlamentar protocolou na Câmara um pedido para que a Prefeitura retome a aplicação ampliada de testes do tipo RT-PCR na rede municipal de saúde da Capital. “O referido teste é recomendação internacional para testagem de Covid, oferecendo segurança no diagnóstico. Por isto, não é razoável que a PMPA interrompa a sua aplicação, se limitando a testes mais rápidos e inconfiáveis”, justifica o vereador. 

Por sua vez, a biomédica Mellanie Fontes-Dutra, uma das coordenadoras da Rede Análise Covid, analisa como boa a maior oferta do teste rápido de antígeno, mas não a diminuição da oferta do RT-PCR.

Mellanie explica que o teste de antígeno é bom para diagnosticar pessoas com sintomas, enquanto o RT-PCR é eficiente para detectar o vírus em pessoas assintomáticas – e que embora sem sintomas, espalham o vírus – e também nos contatos do paciente positivado. A biomédica acredita que não deveria haver a diminuição de um teste em relação ao favorecimento de outro, e que a ampliação da oferta de ambos seria o cenário ideal. 


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