Saúde
|
4 de janeiro de 2023
|
19:23

Ministério da Saúde vai revogar cartilha sobre aborto em discordância com a OMS

Por
Duda Romagna
[email protected]
A ministra da Saúde, Nísia Trindade, durante cerimônia de investidura no cargo.  Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
A ministra da Saúde, Nísia Trindade, durante cerimônia de investidura no cargo. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O Ministério da Saúde do governo Lula (PT), chefiado pela ex-presidente da Fiocruz Nísia Trindade Lima, vai revogar uma cartilha elaborada pela gestão de Bolsonaro (PL) que, em desacordo com as normas da Organização Mundial da Saúde (OMS), minimiza riscos de gravidez na adolescência e que argumentava que “todo o aborto é crime”, mesmo nos casos em que ele é permitido pela lei brasileira (gravidez decorrente de estupro, risco à vida da mulher e em caso de feto anencefálico).

Ao tomar posse na terça-feira (3), a ministra já havia anunciado a intenção de revogar todas as normativas que “ofendem a ciência, os direitos humanos e os direitos sexuais reprodutivos”. Nesta quarta (3), o jornal Folha de S.Paulo informou, citando o novo secretário de Atenção Primária à Saúde, Nésio Fernandes, que a cartilha será revogada.

O documento, lançado por meio da Secretaria de Assistência Primária à Saúde (SAPS), é intitulado “Atenção Técnica para prevenção, avaliação e conduta nos casos de abortamento” e teve sua primeira edição publicada em junho de 2016, mas passou por reformulações. A última, em setembro passado, após críticas de entidades médicas, de direito da mulher e de outros especialistas.

Leia também: Ministério da Saúde refaz cartilha sobre aborto mas segue em desacordo com a OMS

Na primeira edição, a cartilha abertamente sugeria a “manutenção da gravidez com eventual doação do bebê após o nascimento” em casos após as 21 semanas de gestação. A nova versão continua desencorajando a prática, mas não há limite na lei ou na diretriz sobre cuidados no aborto, publicada no início de 2022 pela OMS, que proíba o aborto com base na idade gestacional. Já o trecho que alegava que “todo aborto é crime” foi retirado da cartilha.

Segundo o artigo 128 do Código Penal, de 1940, não se pune aborto praticado por vias médicas no Brasil em dois casos: quando não há outro meio de salvar a vida da gestante e se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal. Em 2012, através da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 54 (ADPF 54), o Supremo Tribunal Federal (STF) incluiu na lei o direito ao aborto quando o feto é anencéfalo, ou seja, quando há má formação do cérebro durante a formação embrionária, com ausência total ou parcial do encéfalo e da caixa craniana.

Leia também: Como estigma e violência institucional afetam até quem tem direito ao aborto no Brasil

Assim, qualquer pessoa com gravidez resultante de uma situação de violência sexual tem direito ao aborto legal de acordo com a legislação brasileira. Ainda, qualquer criança menor de 14 anos, se ficar grávida, independentemente da relação sexual ter sido consentida ou não, ou se houve violência explícita ou não, tem direito ao aborto legal, já que o caso é considerado estupro de vulnerável.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora