Opinião
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5 de novembro de 2012
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17:30

Pragmatismo político e a esquerda que deixou de ser

Por
Sul 21
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Por Carlos Curro, do blog Caia Na Real

Aos meus amigos da “esquerda” pragmática, deixa eu tentar explicar mais uma vez as diferenças entres vocês e a verdadeira esquerda (explicação que, como de costume, será em vão – mas eu estou acostumado e treinando para ser mestre zen).

É o seguinte: só por que a gente às vezes concorda com o que não deve ser feito em hipótese alguma, e só por que a gente concorda que a direita conservadora é muito pior para o país, isso não significa que a gente vai concordar sobre o que deve ser feito (fins) nem como deve ser feito (meios), muito menos com as prioridades e os limites do que pode ser feito, a serem escolhidos nesse caminho.

Essas decisões precisam ser discutidas, avaliadas, e isso precisa ser feito democraticamente, apontando erros e acertos, evoluindo. Assumindo responsabilidades, pesando prós e contras não apenas em termos eleitorais, mas também em termos político-sociais mais amplos (dentro da sociedade civil).

É aí que mora o “detalhe”, meus amigos. Vocês nem querem DISCUTIR isso mais. O debate no “partido” é pra inglês ver – ou pra ingênuo acreditar. Toda crítica que venha da esquerda é ignorada e denunciada como “tola”. Como se vocês fossem gênios e nós, grandes imbecis que não conseguem enxergar o “jogo político”.

Então tá. Que incrível e surreal essa soberba “infalibilidade” de vocês.

Aí, quando no mundo real uma elite latifundiária – que vocês apoiam e que faz parte da coligação pragmática pela “governabilidade” – comete genocídio contra um povo indígena inocente (só para pegar um exemplo recente), o que acontece?

Somente após muita pressão da esquerda verdadeira – e após muita negação de responsabilidade por parte da militância governista, para justificar o injustificável -, então vocês finalmente resolvemcomeçar a correr atrás do prejuízo, e mesmo assim ainda tem pragmático dizendo que não havia nada que podia ter sido feito antes.

Tudo no melhor estilo conservador, retórico e arrogante de “resposta a crises”. Tudo sendo direcionado pelo subjetivo cálculo político imediatista, tornado objetivo pela “técnica da governabilidade”, esse dogma inquestionável para vocês.

E é nisso que somos muito, mas muito diferentes mesmo.

Com essas escolhas deterministas que vocês fazem, e atuando com risíveis profecias autorrealizáveis, o pragmatismo-reformista de vocês, lamentavelmente, fica a cada dia mais distante de qualquer projeto de esquerda.

Só que ainda dá tempo para mudar, sabem.

Abrindo espaço para discussão e para novas propostas, tenho convicção de que é possível manter os avanços sociais, expandi-los e acelerá-los no curto prazo, e ainda adotar um novo modelo de desenvolvimento sociocultural, um modelo justo, humano, onde o econômico não seja o centro, que respeite os direitos de todos, sem exceção, e sem cruéis promessas de “melhorismo” que sempre apontam para um futuro distante que nunca chega, condenando milhões à morte nesse caminho pragmático infeliz.

Mas a pergunta é: vocês querem mudar?

Querem tentar melhorar?

Parece que não.

Uma pena.

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