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22 de outubro de 2012
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09:00

“Já começou o boicote”, diz primeiro prefeito eleito pelo PSOL no país

Por
Sul 21
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“Já começou o boicote”, diz primeiro prefeito eleito pelo PSOL no país
“Já começou o boicote”, diz primeiro prefeito eleito pelo PSOL no país
Gelsimar Gonzaga venceu as eleições em Itaocara sem aliança com outros partidos | Foto: Camila Stael

Samir Oliveira

Gelsimar Gonzaga é o primeiro prefeito eleito pelo PSOL no país. Com 6.796 votos, ele conquistou a vitória na pequena cidade de Itaocara, no Rio de Janeiro.

O município, de economia essencialmente agrícola, é o principal produtor de quiabos no estado e possui pouco mais de 20 ml habitantes. Tradicionalmente governada pelo PMDB, a cidade teve cinco candidatos na eleição deste ano.

O atual prefeito Alcione Araújo (PMDB) concorreu à reeleição numa coligação com PRB, PPS, PSC e PMN. Com o apoio do governador Sérgio Cabral (PMDB), ele ficou em segundo lugar na disputa, com 4.905 votos. O terceiro candidato mais votado foi Antonio Barcelos (PR), que se aliou ao DEM, ao PDT e ao PSB. Com o apoio do ex-governador Anthony Garotinho (PR), ele fez 1.771 votos.

Fundador e presidente do Sindicato dos Servidores Municipais de Itaocara há 18 anos, Gelsimar Gonzaga sempre levou um estilo de vida rural. Ex-cortador de cana de açúcar e ex-entregador de botijões de gás, ele vive no distrito de Portela, a 23 km do centro de Itaocara, numa casa sem telefone fixo ou acesso a internet. E sua mulher, Célia Mar, é merendeira.

A família do candidato não escondeu a emoção da vitória. No dia da eleição, a comemoração ocorreu a céu aberto em Itaocara e a família subiu no palco para parabenizar o prefeito eleito. O pai, um agricultor octagenário, não conseguiu conter o choro.

Gelsimar não é um novato na política. Filiado ao PT desde a sua fundação, ele participou da agitação política e sindical da década de 1980 e se desencantou com o partido após a vitória do ex-presidente Lula, em 2002. Sua filiação ao PSOL ocorreu junto com a fundação da sigla, após a expulsão de Luciana Genro, Heloísa Helena e Babá das fileiras petistas.

Sua primeira candidatura foi em 1992, quando concorreu à Câmara Municipal de Itaocara e obteve apenas 48 votos. Depois, foi candidato a vereador mais duas vezes. Concorreu também a deputado estadual – pelo PT e pelo PSOL – e já havia perdido uma disputa pela prefeitura.

Acompanhado do pai e da mãe, prefeito eleito comemorou a vitória no dia da eleição | Foto: Renato Reis

Nesta entrevista ao Sul21, o futuro prefeito explica como governará a cidade e fala sobre as primeiras medidas que adotará. Dentre elas, estão o corte no seu salário e no salário dos secretários e o compromisso de colocar no comando das secretarias os próprios servidores municipais concursados.

Mesmo com apenas um vereador eleito pelo PSOL dentre as 11 cadeiras da Câmara, Gelsimar afirma que não fará alianças com os demais partidos políticos e que espera contar com o apoio dos cidadãos para fazer o “governo popular”. Além do vereador eleito, Itaocara tem somente 60 pessoas filiadas ao PSOL.

Uma das preocupações da direção nacional do PSOL é de que haja uma “reação conservadora” ao governo do partido. O prefeito eleito afirma que isso já está ocorrendo. “Já começou o boicote. Durante a campanha, os outros candidatos me chamaram de baderneiro e de comunista. E agora estão queimando documentos na prefeitura”, denuncia.

“Durante a campanha, os outros candidatos me chamaram de baderneiro e de comunista. Disseram para a população que seria um caos se eu vencesse as eleições”

Sul21 – Quais serão as primeiras medidas que o senhor vai adotar após assumir a prefeitura?
Gelsimar Gonzaga – A principal medida será instalar os conselhos populares. Eles serão organizados em cada bairro e eu irei pessoalmente nas reuniões. A população é que vai dizer quais são as necessidades e prioridades em cada região. Normalmente, os políticos tradicionais vencem as eleições e não dialogam mais com a população. Acabam tomando decisões e determinando obras e investimentos que não condizem com as necessidades do povo. Nós faremos diferente.

Sul21 – A direção nacional do partido está preocupada com uma possível “reação conservadora” ao governo do PSOL em Itaocara. Como foi a reação dos adversários à sua vitória?
Gelsimar – A reação conservadora e o boicote já começaram. Durante a campanha, os outros candidatos me chamaram de baderneiro e de comunista. Disseram para a população que seria um caos se eu vencesse as eleições. E agora estão queimando documentos na prefeitura. Eu vi com meus próprios olhos, retiram documentos da Secretaria de Obras na calada da noite. Estão com medo porque eu disse na campanha que faria uma auditoria nas contas do município. Essa será outra determinação que colocarei em prática assim que assumir. Vamos auditar todos os contratos e as licitações. Recentemente, começaram a surgir equipamentos no hospital municipal, na sala de Fisioterapia, que não se sabe como foram adquiridos. Já encaminhamos uma denúncia ao Ministério Público sobre a queima de documentos.

Campanha foi feita em cima de um fusca e somente com doação de amigos | Foto: Camila Stael

Sul21 – Como o senhor vai governar a cidade somente com um vereador aliado na Câmara Municipal?
Gelsimar – Optamos por não fazer aliança com partidos políticos de direita durante a campanha e seguiremos essa linha na prefeitura. Eu fui, inclusive, cobrado a manter esse posicionamento durante a campanha. As pessoas me diziam que se eu fizesse aliança, anulariam seus votos. Será um governo popular, então faremos aliança com a sociedade, não com os partidos tradicionais. Entendemos que somente PCB e PSTU representam a classe trabalhadora e, como aqui em Itaocara não tem esses partidos, não nos aliamos a nenhum outro. Será difícil, principalmente em relação à Câmara de Vereadores, sem dúvida. Mas esperamos receber o apoio da população que nos elegeu e acionaremos a Justiça e o MP para que fiquem atentos às tentativas de arbítrio no município.

“Não é porque sou do PSOL que vou deixar de dialogar com o governo do estado e com o governo federal”

Sul21 – Como será a composição do seu secretariado?
Gelsimar – O secretariado será composto por pessoas da classe trabalhadora, sem precisar ser filiado ao PSOL. Vou escolher 50% do secretariado dentro dos próprios quadros da prefeitura, dos servidores públicos concursados. Na área da Educação, vou submeter os nomes que eu escolher à comunidade. Serão os professores, diretores e pais de alunos que irão decidir, dentre os nomes que eu escolher, quem ficará na secretaria de Educação. Além disso, vou reduzir o meu salário e o dos meus secretários. É uma vergonha e um absurdo o prefeito ganhar R$ 15 mil enquanto o salário mínimo no país é R$ 545. Como prefeito eleito e como trabalhador, preciso dar o exemplo. Ainda estamos estudando para verificar de quanto será essa redução, mas isso será feito. E será feito mediante ato do prefeito, para que o salário permaneça assim no futuro.

Futuro vice-prefeito (direita) é radialista de 29 anos | Foto: Camila Stael

Sul21 – O PSOL faz oposição ao governo estadual e ao governo federal. Como será o diálogo com essas instâncias?
Gelsimar – Não é porque sou do PSOL que vou deixar de dialogar com o governo do estado e com o governo federal. O que está em jogo não é o meu partido, mas sim os interesses do povo de Itaocara. Já estou me reunindo com deputados na Assembleia Legislativa e vou conversar com os governos. Ficarei muito feliz, inclusive, se a presidente Dilma me conceder uma audiência. Precisamos de parcerias e convênios com os ministérios. Somos o município com a maior plantação de quiabo do estado, precisamos de investimento do Ministério do Desenvolvimento Agrário, de máquinas e de capacitação profissional para a população rural.

Sul21 – Como o senhor vê os apoios que o seu partido vem recebendo na disputa pelo segundo turno em Macapá e em Belém? Em Macapá, o PSOL festejou o apoio do DEM e do PSDB. Em Belém, o partido está junto com o PT.
Gelsimar – Internamente no PSOL, eu pertenço à CST, uma corrente mais à esquerda no partido. Sou radicalmente contra a política de alianças com a direita em Macapá e Belém e já assinei o manifesto de dirigentes que condena essas iniciativas.


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