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11 de agosto de 2012
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08:23

Os jovens e a arte, paixão e ou investimento?

Por
Sul 21
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Uma conversa rápida, em um almoço, com um jovem médico, residente no interior do estado, me entusiasmou a abordar esse tema que há algum tempo me inquieta. Ele havia visitado diversas edições da Bienal do Mercosul, além de outras exposições que ocorreram na cidade nos últimos anos, e comentou sobre artistas dos quais conhecia o nome, e descrevia os trabalhos com muitos detalhes. Era a fala de alguém que realmente se debruçou sobre as obras, delas se aproximando com um olhar atento e apaixonado.

O campo artístico, nas últimas décadas, tem se evidenciado como um espaço de atuação bastante intensa de jovens artistas. Emergem, dia a dia, tantos novos talentos em busca de estabelecer uma carreira e se inserir no meio artístico que, às vezes, fica difícil seguir tão borbulhante cenário. Como contrapartida, percebe-se, também, o crescimento numérico de jovens interessados em arte, como público e compradores. Anteriormente a este momento, houve a famosa Geração 80, um interessante boom de jovens no meio de arte, marcado pela presença de novos artistas e novo público. Nessa ocasião, surgiram inúmeros dos importantes nomes que hoje se destacam no panorama artístico do País, como Leda Catunda, Nuno Ramos, Leonilson, Karin Lambrecht, Daniel Senise e muitos outros. Atualmente, porém, segundo depoimento de marchands, o dinamismo e a participação dos jovens tem sido maior, em termos numéricos.

Pesquisando sobre o tema, encontrei um artigo em publicação goiana que aborda os jovens compradores. Bastante interessante, o texto surpreende, principalmente por referir-se à situação em uma região periférica do País, onde não há significativo circuito artístico nem mercado de arte. Seja em São Paulo e no Rio de Janeiro, tradicionais centros artísticos, seja em outras regiões mais remotas, os jovens compradores estão em busca de novidades. Ainda que atentos às oportunidades especulativas que a arte pode oferecer, não vêem nesta uma função prioritária. A arte contemporânea tem sido o foco de interesse deste grupo, na maioria das vezes movidos pela paixão, pela intuição e pela identificação com os conteúdos e formas de trabalhos mais atuais. Em geral, esse novo público, em torno de 30 anos, tem o hábito de ir a exposições, feiras e bienais, no Brasil e no exterior, além de, muitas vezes, frequentar ateliês e o círculo fechado das artes plásticas para conhecer e comprar suas obras preferidas. Eles são, na média, profissionais estabelecidos que encontram na arte um foco de interesse. Visitam exposições, lêem sobre o tema, fazem algum curso e procuram especialistas para obter informações. A maioria considera inconcebível adquirir um trabalho que não faça nenhum sentido para si, gostam de se identificar com o que compram, reservando espaços em seus ambientes residenciais e de trabalho para colocá-los. Outros estão mais preocupado com a questão estética, a temática abordada e o desenvolvimento do artista em si. O meio de arte está crescendo e tem sempre novos nomes e propostas surgindo, e a preocupação desses jovens é sua conexão com as obras.

Segundo galeristas, o interesse e a ligação dos jovens com arte, no Brasil, leva a aquisições que variam de R$ 100 a R$ 150 mil por ano em obras. Alguns preferem ter uma história por trás de cada trabalho que compram, mas, em geral, não gastam mais de R$ 5 mil em cada peça, preferindo artistas jovens como eles. Essa é uma opção de risco, por isso mesmo mais emocionante. Procuram acompanhar a evolução de um artista e investir no seu trabalho. Obras em papel e fotografia, por seu custo mais baixo, atraem esses novos compradores, mas, em geral, depois que iniciam suas compras e se aproximam deste mundo, descobrem novas possibilidades, e, sentindo-se mais seguros em suas escolhas, vão ampliando seu leque de opções. A consulta a especialistas, amigos e outros compradores auxilia na definição de padrões de escolha, mas sempre pode surgir uma paixão inesperada. O mercado de arte, visto como espaço de pessoas mais idosas, bem colocadas na vida e muitas vezes já em fim de carreira, se modificou. Possivelmente, o desenvolvimento econômico do país tenha contribuído para essa mudança comportamental, afinal a aquisição de obras de arte é uma atividade de luxo, mesmo que o financiamento seja uma prática neste setor.

Observa-se, ainda, a presença dos jovens não somente como compradores, mas como novo público interessado na fruição. A visitação a exposições em museus, em galerias e em outros espaços tem tido bastante participação dessa faixa etária. Será isso, talvez, resultado de tanto investimento em arte-educação nos últimos anos? Não há, atualmente, estudos de público que comprovem esta ideia, mas vale a pena pensar nisso. Talvez venha sendo formado um novo público através das práticas de visitas monitoradas. E as atividades das escolas em museus não estará trazendo novos interesses para as famílias? Conjecturas à parte, o aumento de número de jovens interessados em arte tem sido evidente nos últimos dez anos. O surgimento de novas e bem equipadas instituições para exposições de artes visuais também funciona como um atrativo, concorrendo para a ampliação do raio de participação e interesse do grande público. Claro que outras atividades, como o futebol e grandes shows, atraem multidões, envolvem emoção, capacidades físicas, e a beleza do espetáculo. Mas eles trazem, também, o espírito de luta, de competição, e certa violência – aspectos dominantes da cultura contemporânea –, e, possivelmente por isso mesmo sejam tão bem aceitos e valorizados. Entretanto, quem sabe alguns jovens estejam buscando aquilo que mais falta no mundo atual: a emoção com o belo, a surpresa de uma descoberta, o valor do homem em sua auto-expressão. Trata-se de um campo de interesse mais introspectivo, um espaço de expansão do sensível.

Às vezes me pergunto qual o sentido de escrever esta coluna semanal, uma vez que, desde que comecei a fazê-lo, meu objetivo foi de contribuir para que se amplie o número de pessoas interessadas no campo artístico de diferentes formas. Assim, é gratificante observar que jovens se interessam por arte sem ser para dela usufruir economicamente ou em termos de status social. Afinal, nela, cada um pode encontrar uma rica experiência pessoal, algo a relembrar com carinho e reviver como um bom momento de vida.


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