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5 de junho de 2012
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16:30

Dia Mundial do Meio Ambiente: mais desafios que comemoração

Por
Sul 21
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Rachel Duarte

Faltando pouco mais de uma semana para o início dos eventos oficiais da Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, destacou o papel dos brasileiros na promoção da sustentabilidade, principalmente nas iniciativas realizadas nas escolas. A declaração ocorreu na véspera do Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado no dia 5 de julho e que traz como tema “Economia Verde: Ela Te inclui?”.

O apelo da ministra se encontra com o tema do evento global a ser realizado no Brasil este mês, mas ao mesmo tempo apresenta possíveis contradições criticadas por ambientalistas. Enquanto se educa para mudar a cultura do consumo e da poluição, se discutirá em âmbito internacional como desenvolver uma nação sem ferir o ecossistema. A defesa dos especialistas é que não há como conciliar o interesse do capital na exploração dos recursos naturais. Diante de tantas concessões feitas pelo governo brasileiro nos últimos tempos, o Dia Mundial do Meio Ambiente não traz motivos de grandes comemorações, defendem.

Para a integrante do Centro de Estudos Ambientais (CEA) do Rio Grande do Sul, Cíntia Barenho, a problemática do meio ambiente e dos riscos à natureza é algo evidente há décadas e não pode ser tratado com uma visão econômica. “A Rio+20 traz até no próprio slogan a máxima do ‘crescimento’. É a visão da gestão brasileira que aposta no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), que é destrutivo ao meio ambiente em alguns aspectos”, defende. Cíntia diz que o desenvolvimento não consegue conciliar os interesses macroeconômicos aos cuidados necessários para uma verdadeira preservação do ecossistema. “E já tivemos uma mostra na reforma do Código Florestal. O mote principal da Rio+20 será a visão mercantil de como os povos poderão explorar a natureza e ‘compensar a degradação’”, fala.

Cíntia organizou, junto a Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul e um coletivo de chargistas gaúchos, uma forma diferente de sensibilizar a população sobre o debate da Rio +20 durante a Semana Estadual do Meio Ambiente. De 4 a 6 de junho, ocorre a exposição “Natureza em risco: A questão ambiental segundo os Cartunistas Gaúchos” em parceria com a Grafar – Grafistas Associados do RS. “Pensamos em unir ao trabalho de denúncia e conscientização que eles fazem com humor nas charges a possibilidade de alcançar a sociedade sobre a necessidade da consciência ecológica”, explica.

Crítica com humor

Exposição Natureza em Risco acontece de 4 a 6 de junho, na Assembleia Legislativa gaúcha | Charge: Santiago

O chargista Santiago, conhecido pelo traço crítico, fala que o Meio Ambiente é um bom tema para ser explorado com desenhos. “É um tema bem presente no humor gráfico. Torna o desenho fácil. É bom desenhar a natureza, árvores, bichos, são símbolos que tocam as pessoas. Principalmente a falta destes elementos. Impacta”, falou o proprietário de um acervo de décadas nesta temática.

A possibilidade de criticar de forma mordaz os temas torna a charge um meio de comunicação ideal para veículos de imprensa. “O tema está até batido, porque aparece em todos os salões internacionais de desenho. Mas nossa vocação é a grande imprensa. O problema é que aqui (RS) é complicado porque não podemos falar das grandes plantações de eucaliptos, por exemplo, que estão aliadas às empresas de comunicação”, critica.

Na visão de Santiago, o tema da mobilidade urbana é outro que poderia ser constantemente abordado nos jornais e acaba restrito a notícias factuais devido à relação comercial. “Atrapalha o negócio das grandes montadoras. É um tema caro para todos. Porque na sociedade, o carro se tornou um vilão do meio ambiente. Mas, no mundo, o domínio das montadoras na publicidade é intransponível”, analisa.

Se por um lado sente-se a falta da crítica por parte dos formadores de opinião de modo geral, o ambientalista Darci Bergmann avalia como positiva a abordagem da mídia sobre o meio ambiente no século 21. “Houve um avanço sobre a importância do tema. Não há quem não aborde o assunto. E percebo matérias aprofundadas. Creio que o trabalho dos ecojornalistas se popularizou e contribuiu para isso”, acredita.

“Maquiagem verde” na Rio+20?

Ativista antigo na causa, Bergmann não ignora que a ‘maquiagem verde’ ainda existe nas coberturas jornalísticas ou mesmo em alguns comentários nos meios de comunicações. “O Novo Código Florestal nunca foi apresentado em sua íntegra. A versão de que as mudanças na legislação afetariam a produção de alimentos é descabida e foi reproduzida por alguns jornalistas. Porém, cana de açúcar não é comida, assim como o fumo. Além do que, o verdadeiro vilão da agricultura é as mudanças climáticas. E o que causa isso?”, indaga.

Sobre a Rio+20, o ambientalista de São Borja, interior do Rio Grande do Sul, é do grupo dos céticos. “Eu estive na Rio 92 e foi superficial, com muita retórica. Tivemos pouco avanço em nível global. Serviu, assim como servirá a Rio+20, para troca de experiências e um pouco mais de proximidade entre os povos sobre o tema. Mas, o controle de natalidade, por exemplo, que se discutiu na agenda 21, anos atrás, não se aplicou. Ainda vemos um família sem ter o que beber tendo uma penca de filhos. Sabemos o impacto ambiental de cada ser vivo no planeta e temos que regular isso”, defende.

O debate proposto pela Organização das Nações Unidas (ONU) para este Dia Mundial do Meio Ambiente, a ‘economia verde’, é, para o coordenador do Ingá Estudos Ambientais, Vicente Medaglia, um jogo de palavras. “Há um marketing das corporações e do governo para afirmar que as políticas empresariais estão no caminho da sustentabilidade. Este termo já se esgotou. Já se ultrapassou todos os limites de convivência harmoniosa entre o capital e o meio ambiente”, aponta.

Ele argumenta que o poder público não prioriza a preservação do meio ambiente e atua de forma despreparada no enfrentamento da questão. “Há uma precarização brutal dos órgãos ambientais. Técnicos mal valorizados no setor privado ou com falta de condições de trabalho no serviço público. Burocracia e falta de prioridade é comum. Por outro lado, há uma falta de informação no sentido ecológico mesmo. Aqui no Rio Grande do Sul temos o exemplo de Cascata, em que há um projeto para oito pequenas hidrelétricas onde o poder público não sabe dizer os limites da vazão do rio de formar a preservar os impactos”, acusa.

Educação ambiental é uma esperança de mudança

Como soluções para mudar o curso das coisas, o governo gaúcho aposta na educação ambiental para formar cidadãos mais cientes da relação com o ambiente. Prevista em lei, a inclusão do tema no currículo escolar é tarefa das Coordenadorias Regionais de Educação, que monitoram o trabalho das escolas.

Alunos e professores construiram colcha de retalhos sobre o Meio Ambiente em 2011./ Foto: SEduc

A Secretaria Estadual de Educação desenvolve formações com os professores para prepará-los para multiplicar os conhecimentos nas coordenadorias e fazer chegar as práticas na sala de aula. “Dialogar de forma integrada é o grande desafio. Fazer com o meio ambiente não integre apenas as aulas de biologia ou ciências. Tem que ser transversal, pois envolve todos os cidadãos”, diz a professora Silvana Favreto.

A escola também deve ser sustentável, afirma. “A gestão deve controlar o consumo de energia, reciclar o lixo, reutilizar a água, reaproveitar materiais, principalmente o pape, já que ainda não compramos papel reciclado na Secretaria. E, o fundamental, sempre procurar educar os alunos para que eles consumam o essencial. Tentar mudar a lógica do consumo. Mas é um exercício diário e trabalhoso”, afirma.

Colcha de retalhos do Meio Ambiente será levada à Rio + 20./ Foto: SEduc

A orientação da educação ambiental é executar ações de continuidade para transcender as datas comemorativas. “No ano passado, na Semana do Meio Ambiente, desenvolvemos uma colcha de vários retalhos em que professores e alunos retrataram como percebem o meio ambiente. Nosso desafio é agora pensar soluções concretas para o que apontamos”, disse a professora que levará a colcha à Rio+20.

“Só com uma transformação de valores e até mesmo no campo espiritual, sobre refletir o sentido de vida das pessoas e a razão delas estarem no mundo, que vamos poder transformar a lógica do consumo de certos produtos e o individualismo fragmentado do desenvolvimento”, avalia Vicente Medaglia.

“Está faltando colocar a mão na massa. Tem gente instruída, com ensino superior que não faz nem a separação do seu lixo. O que falta para o meio ambiente é sair da retórica e do discurso ambientalista”, falou Darci Bergmann, com as mãos embarradas do plantio de mil mudas nativas em São Borja, na Semana do Meio Ambiente.


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