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11 de abril de 2012
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23:20

Estilac pede suspensão do auxílio-moradia a juízes, mas é derrotado no Tribunal de Contas

Por
Sul 21
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Com exceção de Estilac Xavier, conselheiros não veem problemas no pagamento de auxílio-moradia a juízes estaduais | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Samir Oliveira

A sessão do Tribunal de Contas do Estado (TCE) nesta quarta-feira (11) sepultou a possibilidade de que o auxílio-moradia pago a juízes estaduais deixe de ser desembolsado pelos cofres públicos até que seja julgado a legalidade do benefício. O conselheiro Estilac Xavier apresentou um relatório favorável à suspensão, mas foi derrotado no voto por seus colegas. Adroaldo Loureiro, Algir Lorenzon e Iradir Pietroski resolveram ignorar os argumentos expostos durante mais de uma hora por Estilac e acompanhar o entendimento de Marco Peixoto, que não vê problemas no pagamento desse privilégio aos magistrados gaúchos.

O auxílio-moradia – chamado pelos juízes de Parcela Autônoma de Equivalência (PAE) – foi instituído no dia 3 de fevereiro de 2010 por meio de um ato administrativo do então presidente do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), Leo Lima. O argumento dos magistrados estaduais é de que os juízes federais já recebem o benefício, equivalente ao pagamento de auxílio-moradia a deputados federais entre 1994 e 1998, que foi incorporado ao salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Em auditoria realizada na folha de pagamento do TJ-RS em 2010, o Tribunal de Contas constatou em detalhes como é feito o desembolso. Um magistrado que esteja pelo menos desde 1994 na Justiça estadual tem direito a R$ 115 mil de auxílio moradia, mais R$ 275 mil da correção aplicada pelo IGPM e mais R$ 430 mil dos juros, totalizando R$ 820 mil. O valor é distribuído de forma parcelada ao longo dos meses sobre um salário que já está dentre os mais altos do Estado.

O privilégio recai sobre a remuneração, fazendo com que muitos juízes recebam, na prática, um salário muito acima do que é permitido pela Constituição, que estipula um teto de R$ 26,7 mil. Somando todos os magistrados que recebem o auxílio-moradia, o custo para os cofres públicos ultrapassa os R$ 600 milhões.

Em agosto do no passado, o Tribunal de Contas já havia declarado a legalidade do pagamento. O julgamento do auxílio-moradia ocorreu sem ter sido publicado previamente na pauta da respectiva sessão e durou pouco mais de 30 segundos, já que o relator, César Santolim, apenas disse que considerava válido o benefício, sendo acompanhado pelos colegas.

Estilac lembrou que recursos para auxílio-moradia vêm dos cofres do Estado | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sob orientação expressa do governador Tarso Genro (PT), a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) recorreu da decisão no ano passado. O Ministério Público de Contas (MPC) também entrou com recurso. Os dois órgãos exigiram a retomada do julgamento sobre a validade do pagamento de auxílio-moradia, processo que ainda não foi apreciado.

O que foi julgado na sessão desta quarta-feira (11) pelo TCE foram os dois agravos solicitados também pelo MPC e pela PGE, que pediam a edição de uma medida cautelar suspendendo o pagamento do benefício até que o tribunal se posicione novamente sobre o mérito da questão. O relator dos agravos é Marco Peixoto, que não viu motivos para suspender o auxílio-moradia.

Como Estilac Xavier pediu vistas ao processo, acabou relatando a matéria nesta quarta-feira. Ele observou que a Secretaria Estadual da Fazenda nunca foi notificada sobre os custos do pagamento para os cofres públicos e lamentou os danos que a concessão do benefício causam a um Estado que não está numa situação financeira confortável.

Não há previsão de quando ocorrerá a sessão que julgará os recursos da PGE e do MPC para avaliar a legalidade do auxílio-moradia.

“Há um receio de tomar uma decisão contrária ao Poder Judiciário”, critica deputado

O deputado estadual Jeferson Fernandes (PT) é o único parlamentar da Assembleia Legislativa que critica abertamente o pagamento de auxílio-moradia aos juízes estaduais. Na legislatura passada, apenas Nelson Marchezan Júnior (PSDB) – que agora é deputado federal – pautava o assunto.

O petista acompanhou a sessão do Tribunal de Contas do Estado nesta quarta-feira (11) e lamentou a decisão de não suspender o pagamento do auxílio-moradia até o TCE julgar a legalidade do benefício. “Todos os elementos técnicos foram desrespeitados pelo tribunal. Nitidamente há um receito de tomar uma decisão contrária ao Poder Judiciário”, disparou.

Jeferson Fernandes disse que confiança no TCE está "fragilizada" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

O petista observou que os conselheiros não apresentaram “nenhuma justificativa para manter o pagamento” e que “não há fundamento legal ou moral” que permita a perpetuação do privilégio. “A confiança no Tribunal de Contas passa a ser fragilizada. É um desrespeito ao dinheiro público”, comentou.

Jeferson Fernandes alega que a Procuradoria-Geral do Estado tem poder para suspender imediatamente o pagamento de auxílio-moradia, já que o benefício foi instituído por um ato administrativo do Tribunal de Justiça. O deputado pretende conversar com o procurador-geral Carlos Henrique Kaiper sobre o assunto. “Cabe à PGE orientar o Executivo para que seja suspenso o pagamento até o julgamento do mérito. A procuradoria deveria ter coragem de tomar essa atitude”, defendeu.

Ajuris diz que está convicta da legalidade do pagamento

O presidente da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), Pio Giovani Dresch, acompanhou a sessão do Tribunal de Contas do Estado nesta quarta-fera (11) e garantiu que está tranquilo quanto à defesa do que os magistrados chamam de Parcela Autônoma de Equivalência (PAE). “Essa votação confirmou uma decisão que o tribunal já havia tomado por unanimidade. Aguardamos ainda a decisão do mérito e estamos confiantes de que será favorável”, opinou.

Pio Giovani Dresch sustenta que pagamento é legal | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

O juiz garante que o pagamento de auxílio-moradia encontra respaldo legal. “A legalidade da PAE já foi reafirmada em diferentes instâncias, como o Supremo Tribunal Federal e o Conselho Nacional de Justiça. Não temos temor de que possa haver o reconhecimento de uma ilegalidade”, assegura.

Geraldo Da Camino questiona caráter do auxílio-moradia

Mesmo que o Tribunal de Contas do Estado (TCE) venha a decidir que o auxílio-moradia aos juízes gaúchos é ilegal, dificilmente o dinheiro já pago aos magistrados retornará aos cofres públicos do Rio Grande do Sul. Isso porque há na jurisprudência um princípio já consagrado que diz que pagamentos efetuados de boa fé e com caráter alimentar não podem ser devolvidos.

O procurador-geral do Ministério Público de Contas (MPC), Geraldo Da Camino, questiona a aplicação desse princípio para o caso gaúcho. “Tenho dificuldade de vislumbrar esse caráter alimentar em valores tão expressivos para beneficiários que já recebem remuneração próxima ao teto salarial do Estado. Não me parece que alguém seria privado da sua subsistência se esses pagamentos fossem sustados”, declarou, em entrevista após a sessão desta quarta-feira (11) do Tribunal de Contas do Estado.

Geraldo Da Camino questiona caráter alimentar do benefício | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Como o MPC foi um dos órgãos que entrou com recurso para que o TCE volte a julgar a legalidade do auxílio-moradia, Da Camino evitou se manifestar abertamente sobre o mérito do benefício, já que ele terá que emitir um parecer sobre o tema quando o processo for apreciado.

O procurador explicou que dois princípios jurídicos embasaram o agravo regimental apresentado, solicitando que o TCE suste os pagamentos até que o mérito seja julgado: o perigo na demora em não se adotar essa medida e a suposição de verossimilhança na afirmação de que a concessão do benefício é ilegal.

Auditores apontam contradições no posicionamento dos conselheiros

O presidente do Centro dos Auditores Públicos Externos do Tribunal de Contas do Estado, Amauri Perusso, não esconde o descontentamento com a forma como a cúpula do TCE vem tratando o julgamento do auxílio-moradia aos juízes gaúchos. Ele sustenta que o trabalho técnico dos servidores, que aponta a irregularidade do benefício, vem sendo desprezado pela maioria dos conselheiros.

Amauri Perusso critica posicionamento dos conselheiros favoráveis ao auxílio-moradia | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Numa audiência pública sobre o tema na semana passada, Amauri disse que César Santolim, que julgou pela primeira vez o assunto em agosto do ano passado, “destruiu” em alguns segundos todo o trabalho feito pelos técnicos ao simplesmente alegar a legalidade do auxílio-moradia sem apresentar nenhum argumento que sustentasse a posição. Nesta quarta-feira (11), o auditor apontou incoerências na posição do conselheiro Adroaldo Loureiro, que disse ter “sérias dúvidas” sobre o pagamento do privilégio, mas acabou votando pela não suspensão do benefício.

“Ele apresenta dúvidas e tem sensibilidade em relação ao voto do Estilac e, no entanto, comodamente, se dispõe a acompanhar a posição de Marco Peixoto. Na dúvida se protege o erário público, não se introduz a incoerência”, critica.


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