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19 de abril de 2012
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19:50

Crack, é possível vencer

Por
Sul 21
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Esta semana o governo federal anunciou que investirá R$ 4 bilhões no programa Crack, é possível vencer,em todo o Brasil e R$ 103 milhões no Rio Grande do Sul. Um passo importante nessa luta que, há alguns anos, parecia sem saída para os usuários. Uma mudança de paradigma que nos anima e nos dá mais responsabilidades no combate a esse mal e na ação efetiva na recuperação dos dependentes.

Com três importantes eixos, o programa atuará de forma direta e incisiva nos gargalos: combate ao narcotráfico; prevenção junto à sociedade civil; e garantia de atendimento de saúde aos dependentes da droga. E aqui chego a um ponto que julgo um dos mais essenciais: a recuperação efetiva dos usuários. São eles que nos mostrarão, na prática, que é possível superar esse problema, são eles que nos conduzirão através do seu exemplo a uma vitória. Que não será simples, nem em curto prazo. Por isso a garantia do acesso ao tratamento é tão fundamental.

Em Porto Alegre, por exemplo, algumas ações caminham no mesmo sentido do programa nacional. Um deles, em especial, faz um recorte dos usuários que precisa de atenção especial: as grávidas usuárias de crack. Sob orientação do professor Dr. Flávio Pechansky, o Hospital de Clínicas de Porto Alegre tem um projeto de intervenção terapêutica em gestantes usuárias de crack e outras drogas lícitas e ilícitas, identificando os efeitos no neurocomportamento do recém-nascido, na interação mãe-bebê e na evolução materna e do lactente aos três meses de vida.

Esse recorte permitirá o acompanhamento das mães, ajudando-as a manterem-se longe do vício durante a gravidez e após, através de um dos laços mais fortes que existem: a maternidade. Não são poucos os relatos de mulheres que deixaram as drogas e afirmam que somente o amor por um filho as mantêm, diariamente, longe do vício e da tentação de uma recaída. Segundo o projeto do HCPA, estudos prévios demonstram que grande parte das gestantes usuárias de drogas persiste no uso mesmo após o primeiro trimestre da gravidez.

Ao estabelecer um diagnóstico preciso da patologia das mães e estimular a troca da droga crack por tratamento adequado através de intervenções psicossociais é possível favorecer o desenvolvimento da capacidade da mãe como cuidadora. O projeto prevê, nesse sentido, o estímulo da interação mãe-bebê.

Segundo o estudo, quando avaliados logo após o nascimento, os bebês expostos à cocaína ou crack durante a gestação demonstram várias dificuldades como alterações na auto-regulação, na motricidade e no tono muscular. Já os recém-nascidos expostos à cocaína durante o período pré-natal podem apresentar sinais de instabilidade autonômica, diminuição no crescimento fetal e maiores taxas de complicações respiratórias, infecciosas, como infecção generalizada, hepatites, sífilis e infecção pelo HIV. Na prática, isso aumenta consideravelmente os custos nos cuidados de saúde destes bebês para o sistema público de saúde.

Outro tema fundamental que reforça a importância do projeto é a relevância da garantia da primeira infância saudável, fundamental para o desenvolvimento neuropsicomotor. Se não houver uma intervenção eficaz, a criança torna-se mais vulnerável ao desenvolvimento de transtornos mentais e é maior incidência de uso de álcool e outras drogas no futuro.

O projeto é pioneiro e de grande relevância para a cidade, especialmente se considerarmos o momento que vivemos: o Brasil contra o crack. O problema, porém, é que as usuárias não estão chegando ao HCPA. Elas precisam ser encaminhadas através dos Postos de Saúde. Estes apresentam problemas crônicos de atendimento e isso acarreta na distância das usuárias do atendimento. É preciso, então, Postos em condições e uma ação incisiva na busca dessas mulheres. Não se pode esperar que elas busquem atendimento, porque a luta pela sobrevivência é maior do que a clareza de que precisam de ajuda.

Podemos, sim, vencer o crack, mas é preciso enfrentamento combativo e eficiente.


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