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22 de março de 2012
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23:48

Audiência pública debate controversa hidrelétrica no Rio Pelotas

Por
Sul 21
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Foto: Mathieu Struck/Flickr

Felipe Prestes

A construção da Usina Hidrelétrica Pai Querê, que vai represar o Rio Pelotas na divisa entre Rio Grande do Sul e Santa Catarina, será debatida em audiência pública nesta sexta-feira (23), em Porto Alegre. O debate ocorrerá no Sindicato dos Engenheiros (Av. Érico Verissimo, 960), às 19h. Ambientalistas contestam a usina, cuja construção está prevista pelo Governo Federal desde os anos 70, mas ganhou força ao ser incluída nas obras do PAC. Quem se opõe ao empreendimento argumenta que a preservação da região atingida é prioritária.

O debate em Porto Alegre tem um caráter inédito, por ser na capital do Estado e não na região atingida, permitindo a participação de mais pessoas interessadas no tema. “É a primeira vez que há uma audiência pública fora do local do empreendimento. É uma conquista para o movimento ambientalista de Porto Alegre”, afirma Paulo Brack, professor de Biologia da UFRGS, integrante do Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá) e membro do Conselho Nacional do Meio-Ambiente (Conama).

Apesar disto, Brack não acredita que haja muito a comemorar. Ao contrário, o biólogo vê a construção da usina como o fim de uma área prioritária para a preservação de fauna e flora. O primeiro aspecto levantado pelo biólogo é que Pai Querê será a sexta usina da bacia do Rio Uruguai, interrompendo corredeiras que são essenciais para muitas espécies de peixes. “É uma sequência de absurdos no Rio Uruguai. O rio está morrendo”, sentencia.

O quadro pode ser ainda mais grave se forem concretizados todos os projetos de usinas. Aí pularia para onze o número de hidrelétricas na bacia do Uruguai. Para evitar o acúmulo de hidrelétricas, Brack defende o zoneamento de bacias, algo que a FEPAM havia iniciado durante o Governo Olívio e que não teve sequência.

O professor da UFRGS também pontua que cerca de 4 mil hectares de florestas de araucárias seriam cortados ou alagados. Consiste numa área semelhante a 4 mil campos de futebol e 2,5 vezes maior que a área arborizada de Porto Alegre, que é considerada uma das grandes cidades mais arborizadas do país. Pesquisadores calculam que haja cerca de 200 mil araucárias na região a ser atingida pela hidrelétrica. “A floresta de araucárias está reduzida a 2% de sua área original. Vão destruir o pouquinho que sobrou”, diz.

Brack explica que a região onde deve ser construída a usina fica em uma área de escarpada, de encostas de serra, inviável para a agricultura. Por esta característica, se tornou uma das poucas regiões do país que preserva várias espécies de fauna e flora sem ser unidade de conservação. “Aquela área é considerada uma área prioritária para preservação pelo próprio Ministério do Meio-Ambiente”, ressalta.

Brack: Pai Querê serve à produção de matéria-prima para exportação | Ramiro Furquim/Sul21

Modelo de exportações de matéria-prima está por trás das usinas, diz professor

A usina de Pai Querê deve ter capacidade instalada para produzir 290 MegaWatts, cerca de duas vezes a capacidade do parque eólico de Osório. Para Paulo Brack, a população da região próxima a Pai Querê poderia receber mais energia, caso seja necessária, com a construção de parques eólicos. Ele aponta que a demanda por energia hidrelétrica não é da população, mas de grupos que produzem matéria-prima para exportação com gasto intensivo de energia. O consórcio que fará a usina é formado principalmente pelo Grupo Votorantim (80%), que atua em siderurgia e metalurgia e pela Alcoa Alumínios S/A (15%), que produz alumínio para exportação em um processo muito intensivo em gasto de energia.

“É claro que no modelo atual, de crescimento ilimitado, vão querer todo o tipo de energia. Em outro modelo, de crescimento sustentável, não seria necessário construir tantas hidrelétricas, mas parques eólicos”, diz o biólogo. “É lamentável que a produção de alumínio para exportação esteja por trás deste projeto”, afirma.

O Sul21 procurou o Ministério das Minas e Energia desde esta quarta-feira (21) para ouvir os argumentos que justificam a construção da usina, mas não conseguiu obter uma entrevista até o momento de publicação da reportagem.

Pai Querê vai interromper corredeiras do Rio Pelotas, essencial para espécies de peixes, aponta Paulo Brack | Foto: Mathieu Struck/Flickr

Imbróglio jurídico precedeu audiências públicas

A audiência desta sexta-feira foi confirmada após um imbróglio jurídico. O Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá) havia conseguido liminar na Justiça Federal, suspendendo o encontro de Porto Alegre e mais três audiências em outros municípios, sob alegação de que o IBAMA não tornou públicos todos os documentos do processo de licenciamento ambiental. A ONG havia requisitado documentos ao órgão há 45 dias, mas não obteve resposta. O InGá desejava ter acesso aos documentos antes da realização da audiência e a Justiça Federal determinou que as audiências só poderiam ser realizadas após a disponibilização destes documentos.

Na quarta-feira (21), no entanto, o IBAMA conseguiu no TRF da 4ª região garantir a realização da audiência pública, argumentando que só é necessário disponibilizar o EIA RIMA (estudo e relatório de impacto ambiental). O desembargador federal Fernando Quadros da Silva entendeu que a realização do debate não traria dano irreparável que justificasse sua suspensão.

Duas das quatro audiências previstas já foram realizadas; nesta quinta-feira (22), em Bom Jesus, município do norte do Rio Grande do Sul e na quarta-feira (21), em Lages, no sul de Santa Catarina – ambos próximas à região atingida pela construção da usina. A audiência em São Joaquim (SC), que estava marcada para terça-feira (20), precisará ser remarcada, porque ainda vigia a liminar do InGá.


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