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22 de janeiro de 2012
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16:43

Justiça paulista ignora decisões federais e PM invade Pinheirinho

Por
Sul 21
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Da Redação
Atualizado às 23h18

A PM paulista iniciou às 6h da manhã deste domingo (22) a reintegração de posse do Bairro Pinheirinho, ocupado há oito anos por pelo menos 5,5 mil moradores, que pertence à massa falida de uma empresa de Naji Nahas. O juiz estadual Rodrigo Capez acompanha as ações e determina que a PM ignore liminares vindas da Justiça Federal que ordenam o fim da ação. Rodrigo é irmão do deputado estadual Fernando Capez, do PSDB.

“O que está acontecendo em Pinheirinho é muito grave. É desobediência a uma ordem judicial. Conflito entre Justiça Federal e Estadual não pode por em risco milhares de pessoas. A ordem judicial do TRF tem que ser cumprida”, afirmou no Twitter o presidente da OAB nacional, Ophir Cavalcante. Segundo ele, a última determinação judicial é do TRF3 e deve ser cumprida enquanto o STJ não define se a competência para a matéria é da Justiça Estadual ou Federal. “Houve quebra do pacto federativo”, acusou Ophir Cavalcante, apontando também a possibilidade de violação de direitos humanos durante a ação policial.

Durante a semana, a massa falida da Selecta S/A, dona da área e responsável pelo pedido de reintegração, havia aceitado congelar por 15 dias seu processo de falência. A medida, homologada pelo juiz de falências da capital, Luiz Beethoven Giffoni, abria margem para que a reintegração de posse fosse adiada durante igual período, enquanto se discutia a competência legal sobre a questão e se negociava uma solução pacífica para o impasse. Porém, a juíza da 6ª Vara Cível de São José, Márcia Mathey Loureiro – que já havia derrubado liminar anterior que impedia a reintegração – deixou o Fórum neste sábado sem dar um parecer sobre o documento, permitindo que a ação da PM fosse realizada no domingo.

Juiz estadual fala em “tranquilidade”; relatos são de violência

“Está tudo na maior tranquilidade possível”, disse Rodrigo Capez, em entrevista reproduzida pelo jornal O Vale. “Os PMs estão convidando as pessoas a retirar seus pertences e elas estão saindo sem desordem e não há nenhuma hostilidade. Acreditamos que a ação termine ainda hoje”. Em nota oficial, a Polícia Militar de São Paulo afirma que a reintegração foi “pacífica”, garantindo ter feito apenas 16 detenções e não registrando feridos ou mortos, em um clima de “tranquilidade”.

Os relatos, no entanto, parecem contradizer essas visões. Por enquanto há notícias oficiais de um morador ferido por bala, que foi encaminhado para um hospital, passou por cirurgia e seu estado é estável. Existem relatos de mortes, mas as informações ainda são desencontradas e não há confirmação oficial. A PM mobilizou dois mil homens da Tropa de Choque e da Rota, dois helicópteros Águia e veículos blindados, além do Corpo de Bombeiros. Os moradores receberam a Tropa de Choque com barricadas e atearam fogo em três pontos do bairro. Há denúncias de que telefone, luz e internet foram cortadas em Pinheirinho e nas comunidades próximas.

Não se tem maiores informações sobre o conflito porque os moradores estão sitiados. Imprensa e pessoas que não moram no local são proibidas pela Polícia de entrar em Pinheirinho, denuncia o jornalista Leonardo Sakamoto. Vários políticos, como os deputados federais Ivan Valente (PSOL-SP) e Protógenes Queiroz (PCdoB-SP) e o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), encontram-se em Pinheirinho ou estão em deslocamento para o local. Segundo o jornal O Vale, tratores já estariam colocando abaixo as casas desocupadas.

Foto: Felipe Milanez
Tendas foram armadas para receber moradores removidos de suas casas; confusão impera na área | Foto: Felipe Milanez

O que se vê pelas imagens de portais de São Paulo são mulheres com crianças sendo encaminhadas para fora da área com bebês no colo por policiais com granadas e armas de grosso calibre nas mãos. Em protesto, moradores atearam fogo em carros de emissoras de televisão e ocuparam a Rodovia Dutra. Cerca de 100 estudantes e representantes de movimentos sociais estão em frente ao condomínio onde reside prefeito de São José dos Campos, Eduardo Cury (PSDB). Além disso, cerca de 400 pessoas estão reunidas sob o vão do MASP, tradicional ponto de encontro para manifestações na cidade de São Paulo, com a intenção de promover uma caminhada de protesto contra a ação.

Até secretário da República foi alvo de balas de borracha

No Twitter, o blogueiro e jornalista Renato Rovai afirma ter conversado com assessores do deputado Paulo Teixeira (PT-SP) que estão no local. Segundo eles, houve tentativa de negociar um adiamento da ação no último sábado, e o governo estadual (a cargo de Geraldo Alckmin, do PSDB) teria acenado com a concordância em esperar 15 dias para agir. Porém, mudou de ideia no dia seguinte, e recusou-se a interromper a ação, alegando soberania da Justiça de SP na questão. Segundo ele, é impossível confirmar mortes, mas há muitos feridos e muita confusão nas áreas destinadas ao cadastramento dos moradores removidos de suas casas. “Neste local estão amontoados crianças, cachorros, botijões de gás, senhoras chorando. É um cenário de área de refugiados”, diz Rovai. Segundo o deputado federal Paulo Teixeira, o Secretário de Articulação Social da Presidência da Republica, Paulo Maldos, foi recebido a tiros de bala de borracha quando tentou entrar em Pinheirinho.

A assessoria de imprensa da prefeitura de São José dos Campos emitiu comunicado na tarde deste domingo. Sem entrar em detalhes sobre a ação policial em Pinheirinho, a nota informa que “até 14h30 deste domingo, a equipe de assistentes sociais da Prefeitura atendeu 235 famílias, totalizando cerca de 900 pessoas”. Desse total, segundo o documento, 120 famílias estão de mudança para outros endereços na cidade; 56 famílias estão alojadas em abrigos temporários; 54 famílias terão alojamento de curto prazo em abrigos; e 4 famílias irão para suas cidades de origem com passagens fornecidas pela Prefeitura, sendo 3 inter-estaduais e uma intermunicipal. “As famílias receberam alimentação, apoio social e apoio para transporte e guarda de seus móveis e utensílios”, garante a nota.

Ministro diz que ação “atropela” negociações

O ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, declarou no domingo (22) que a ação policial em Pinheirinho “atropelou” negociações do governo federal para uma solução pacífica do impasse. Ainda que evitando atacar diretamente o governo de São Paulo, o ministro disse estar surpreso com o cancelamento de uma reunião agendada com o prefeito Eduardo Cury na última quinta-feira, e lamentou ter sido “surpreendido” pela ação. Segundo ele, a presidenta Dilma Rousseff está ciente dos acontecimentos e destacou para acompanhar o caso, além do próprio Gilberto Carvalho, os ministros José Eduardo Cardozo (Justiça) e Maria do Rosário (Secretaria de Direitos Humanos).

O vídeo abaixo mostra algumas cenas da ação policial em Pinheirinho, incluindo um homem atingido no peito por uma bala de borracha.

http://youtu.be/jeKnmhm4Ugs

Atualização (23h18)

Parte dos moradores removidos de Pinheirinho que não conseguiram pouso na casa de parentes ou conhecidos passarão a noite em dois barracões da prefeitura de São José dos Campos. São espaços de chão batido, onde faltam colchões e cobertas para todos. Não há água encanada e sistema de higiene, apenas banheiros químicos. Outros desalojados ocupam a igreja Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. A prefeitura de São José dos Campos afirma que há uma lista de locais para receber os desalojados, mas os locais não são divulgados à imprensa por “questões de segurança”.

Atualização (00h04)

O presidente da OAB, Ophir Cavalcante, acaba de confirmar em sua conta no Twitter que o STJ decidiu ser de competência da Justiça estadual a questão envolvendo Pinheirinho. “Acabo de saber que o Presidente do STJ decidiu, agora à noite, que a competência é da Justiça Estadual”, afirmou Ophir. “Agora é zelar para que não haja violações a direitos humanos”.

Com informações de R7, G1, Folha de S. Paulo, Rede Brasil Atual, Diário Liberdade e O Vale


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