Opinião
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22 de dezembro de 2011
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23:00

Projeto de Lei do Largo Glênio Peres: um sinal de que a democracia em Porto Alegre está a perigo

Por
Sul 21
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Por Cristiano Lange dos Santos e Marcelo Sgarbossa

É com espanto que lemos no Sul 21 a notícia de que a Câmara de Vereadores de Porto Alegre aprovou o Projeto de Lei 038/2011, que restringe atividades no Largo Glênio Peres.

Refletindo sobre a informação, nos questionamos e a associamos ao livro de Norberto Bobbio (O futuro da democracia?) no qual ele questiona quais as perspectivas para a consolidação democrática do mundo, sem jamais esquecer que democracia designa a forma de governo na qual o poder político é exercido pelo povo e para o povo.

Baseados em fatos concretos acontecidos recentemente poderíamos responder que em Porto Alegre a democracia está ruindo.

Primeiro, foi a investigação da Massa Crítica, que é um movimento pacífico de celebração da bicicleta, sem qualquer organização ou direção, que acontece naturalmente toda a última sexta-feira do mês, pelo Ministério Público Estadual, sob a alegação de que haveria “potencial infração à ordem urbanistica em razão de irregularidades nos eventos organizados”.

O que se pede é apenas “mais amor e menos motor”. Será que estão pedindo muito?

Então, pedalar e protestar por uma cidade mais humana agora é crime? Segundo Norberto Bobbio, para consolidar a democracia é preciso a garantia de certas liberdade, principalmente de expressão e manifestação, sem o que tratar-se-ia de qualquer outro regime, menos de uma democracia.

Em segundo, e talvez o mais grave, porque está relacionada à intervenção direta e concreta dos Poderes de Estado: a Prefeitura Municipal e Câmara de Vereadores, aprovando uma lei que restringe a utilização do Largo Glênio Peres à população.

É um retrocesso, porque imaginamos que caminhamos para a consolidação da democracia ao mesmo tempo que tentam nos tolher o direito de utilizar os espaços públicos, sob a alegação de buscar melhores condições para a cidade e para as pessoas.

Será que eles sabem que a praça é um sinônimo de democracia?

Para termos uma ideia, em Atenas, na Grécia antiga, considerada o berço da democracia, a praça era o centro do debate. A praça era verdadeiramente pública e o debate também. No Brasil, em épocas mais nebulosas e não tão distante, as “músicas de protesto” também retratavam a ausência de democracia e liberdade, citando a praça como referência de liberdade e participação popular. Vale lembrar as músicas Novo Tempo (“A gente se encontra cantando na praça, fazendo pirraça”) e Quaresma (“A praça não é mais da gente”) de Ivan Lins, por exemplo.

Assim, o Largo é um local vital para a cultura porto-alegrense, pois é nesse espaço público que acontecem — ou ao menos aconteciam — manifestações artístico-culturais e políticas da cidade. É considerado um dos centros de efervencência cultural e política da cidade de Porto Alegre e é estratégico, uma vez que localiza-se em frente ao Mercado Público e à Praça XV de Novembro.

Este é o espaço que, se não fosse a mobilização da população, de “pessoas menos qualificadas” — manifestação no Secretário Nagelstein sobre os ciclistas — estaria totalmente tomada por carros.

Perguntamos, é isso o que se quer? Transformar o Largo Glênio Peres num grande estacionamento e Porto Alegre numa cidade sem as mínimas garantias de democracia?

Ou queremos pessoas e vida naquele e nos demais espaços que são públicos?

Pessoas na praça é sinal de democracia. É garantia de que podemos mudar. A mobilização, portanto, é fundamental para afastarmos qualquer risco de medidas antidemocráticas, independente de onde venha. Por isso, estão todos convidados a participar do movimento Largo Vivo, que é feito todas as terças-feiras, a partir das 18 hs, no Largo Glênio Peres.

Queremos democracia, diálogo e principalmente respeito para com o cidadão de Porto Alegre. Nada mais que isso!!!

É com base na alegria e na participação coletiva que construiremos uma cidade mais humana e feliz.

Cristiano Lange dos Santos é advogado militante em direitos humanos. Especialista e Mestre em Direito, foi Professor de Direito Constitucional na Faculdade de Direito da Anhanguera de Passo Fundo. Atua como procurador Jurídico do Laboratório de Políticas Públicas e Sociais – LAPPUS.

Marcelo Sgarbossa é advogado militante em direitos humanos. Mestre e Doutorando em Direito pela UFRGS, professor da ESADE e Diretor-Geral do Laboratório de Políticas Públicas e Sociais – LAPPUS


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