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16 de outubro de 2011
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03:47

Patrimônio: restauro da Igreja das Dores será concluído em 2012

Por
Sul 21
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As torres e a escadaria caracterizam a Igreja Nossa Senhora das Dores | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Nubia Silveira (texto) e Flavia Boni Licht (consultoria)

A construção da Igreja Nossa Senhora das Dores, de Porto Alegre, levou 100 anos para ser concluída. A demora provaria a inocência de um escravo condenado injustamente à morte, por roubo de tijolos e outros materiais. Uma velha lenda conta que Josino, negro de propriedade de Domingos José Lopes, trabalhava na obra e, ao ser condenado à forca, sem direito à defesa, rogou uma praga ao seu dono: ele morreria sem ver o templo finalizado. Josino foi enforcado na praça em frente à Igreja. Se a demora foi resultado da praga, ninguém sabe afirmar. O certo é que a Igreja, que começou a ser construída em 1807, só foi inaugurada em 1903. Pároco das Dores há quase três anos, o padre Luiz Carlos de Almeida acha que a divulgação da lenda ajuda a atrair visitantes, mas também leva a comunidade a aceitar atrasos em obras ali realizadas, como o restauro, iniciado em 2008, com conclusão prevista para o início de 2012, segundo a arquiteta Dóris Oliveira, do Projeto Monumenta.

Restauro da Igreja das Dores teve início em 2008 | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

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No fim do século XIX, a Igreja ainda não tinha as torres l Foto: http://www.igrejadasdores.org.br

Dóris, responsável pela fiscalização do restauro, projetado pelo arquiteto Edegar Bittencourt da Luz, e desenvolvido pela EPT – Engenharia e Pesquisas Tecnológicas S/A, foi uma das leitoras que reconheceu a Igreja nas fotos publicadas na semana passada. A leitora Suzana Schunck Brochado, que também acertou a resposta, protesta: “Não vale a Dóris”. O Monumenta investiu R$ 2, 15 milhões na restauração parcial do prédio. As obras contemplam recuperação da cobertura, das escadarias das torres e das esquadrias, pintura externa, troca de piso da nave, adequação dos sanitários e do salão de festas, reforma do salão paroquial e construção de rampas, dando acesso à Igreja pela Rua Riachuelo.

A Igreja em 1930 l Foto: http://www.igrejadasdores.org.br

A arquiteta Dóris revela que o trabalho de restauro da Igreja das Dores é minucioso e lento. A lentidão se deve a várias paradas na obra e também à dificuldade encontrada, por exemplo, na colocação de ladrilho hidráulico na nave. Ela também conta que o branco foi mantido como cor original da Igreja, própria do estilo barroco. E as prospecções feitas por ela revelaram, por exemplo, que as esquadrias eram de um cinza esverdeado.

Tombada em 1938, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, a mais antiga igreja de Porto Alegre se caracteriza pelas duas torres e pelos 65 degraus que a ligam à Rua da Praia. A arquiteta Dóris Oliveira afirma que, devido à demora na construção, a Igreja foi agrupando novos estilos. Inicialmente no estilo barroco, a fachada acabou tendo uma linguagem eclética, projetada pelo arquiteto Júlio Weise. Aí estão três esculturas, assinadas por João Vicente Friedrichs, que representam a Fé, a Esperança e a Caridade. As talhas dos altares são do artista português João do Couto e Silva e as pinturas dos forros, de Germano Traub.

Foram necessários 100 anos para concluir a construção das Dores | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Recursos para a manutenção

A mais antiga igreja de Porto Alegre nasceu da fé dos açorianos l Foto: www.igrejadadores.org.br

O padre Luiz Carlos de Almeida conta que tão logo o restauro seja concluído dará início a um programa de visitas guiadas pela igreja, incluindo as torres, que durante anos ficaram inacessíveis, devido ao mau estado das escadas. Ele alerta para a importância do conjunto de imagens do século XVIII, como as que retratam os passos da Paixão de Cristo, vindas de Portugal.

O pároco reconhece a necessidade de manutenção do prédio, que ainda tem partes a serem restauradas. Dóris afirma que o Monumenta não prevê recursos para a segunda fase de restauro da igreja. E o padre Almeida afirma que a manutenção será feita com parte do que for arrecadado no estacionamento, com as visitas guiadas e com as gravações de corais e orquestras feitas no interior do templo. O religioso diz que os visitantes são muitos. Para atendê-los mantém o local aberto das 8h às 20h, precisando investir em funcionários que atendam as pessoas. Ele, no entanto, não tem uma estatística das visitas.

Quando o restauro estiver concluído, terão início as visitas guiadas | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Casas salvas da demolição

Na Rua Félix da Cunha, no Bairro Moinhos de Vento, há um grupo de casas, construídas em 1931, que se mantém preservadas, em consequência de um movimento, liderado pelo arquiteto e professor Carlos de Azevedo Moura. Ele conta que ficou sabendo na Faculdade de Arquitetura da UFRGS, onde lecionava, que as oito casas geminadas, projetadas pelo arquiteto tcheco Egon Weindorfer e construídas pelo seu pai, Fernando de Azevedo Moura, corriam risco de demolição, para dar espaço ao alargamento da rua. Partiu para a luta pela preservação das “casas simples e despojadas”, construídas para serem alugadas. Hoje, a maioria delas são espaços comerciais e apenas duas ainda têm moradores. Numa, mora o professor, que mantém no sótão o seu escritório.

As casas geminadas da rua Félix da Cunha foram tombadas pela EPAHC em 1989 | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

A firma de Fernando, a Azevedo Moura & Gertum, começou a construir na década de 1920. Entre as obras da empresa estão os edifícios Sulacap e Sul América no Centro de Porto Alegre, e o Jockey Club, no Cristal. Carlos de Azevedo Moura chama a atenção para um detalhe: cada casa da Rua Félix da Cunha foi construída em um terreno pequeno com 6,90 m de frente e 14 m de fundos. Os sobrados, com 150 metros quadrados de área útil, contavam com uma grande novidade para a época: garagem para carro, que ficava no térreo. O primeiro andar foi destinado à parte social e o segundo, aos dormitórios e banheiro. Havia ainda a possibilidade de construir um sótão, o que Carlos fez em sua casa, e um jardim.

O grupo de oito casas foi construído em 1931 | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Os sobrados foram construídos em tijolos maciços, sendo revestidos com um reboco salpicado. Já as molduras das janelas – ressalta o arquiteto – são lisas. No telhado, foram colocadas telhas francesas. “Passados 80 anos, as casas não têm qualquer rachadura”, orgulha-se Azevedo Moura.

Os sobrados sofreram poucas intervenções | Ramiro Furquim/Sul21

As intervenções feitas nas casas foram pequenas, afirma Azevedo Moura. No caso do sobrado onde reside e trabalha, além da abertura do sótão e a colocação de uma escada de acesso a ele, foi trocada parte do piso de madeira, destruído pelos cupins. O arquiteto também providenciou em janelas com vidro duplo, para isolar o som da rua e manter a temperatura em níveis agradáveis. “No verão está sempre fresquinho e no inverno, quentinho”, diz ele.

Próximo às casas geminadas, e também tombado, está o chamado Pátio Ivo Rizzo, “um shoppinzinho”, como o qualifica Azevedo Moura. A linguagem arquitetônica é diferente das casas construídas pela Azevedo Moura & Gertum. O prédio “está solto dentro do terreno”, afirma o arquiteto, e já sofreu várias intervenções. O conjunto tombado pela EPAHC, em 1989, na Rua Félix da Cunha inclui os sobrados de números 1143, 1145, 1155, 1157, 1167, 1169, 1179, 1181 e da residência número 1215, onde funciona o Pátio Ivo Rizzo.

Casa tombada na esquina da Félix da Cunha com a Padre Chagas se transformou num peuqeno shopping l Foto: Flickr

Quixotes do Parque

Envolvido em nova batalha, Azevedo Moura lembra que quando deram início ao movimento de preservação do bairro Moinhos de Vento, o Moinhos Vive, foram chamados de “Quixotes do Parque”. Ele explica que o grupo não tem nada de quixotesco, nem é contra o crescimento. Quer apenas evitar a destruição total do bairro, cuja infraestrutura destina-se a atender uma população menor, que vivia ali em 1930, quando nasceu a região. “O Movimento Moinhos Vive quer salvar o bairro”, afirma.

A mais nova luta é pela preservação de um grupo de casas da Rua Luciana de Abreu, que representa a arquitetura de uma época e é parte da história da cidade. No lugar das casas está prevista a construção de duas grandes torres de apartamentos, que – segundo Azevedo Moura – descaracterizariam a linguagem arquitetônica do Moinhos. O impacto ambiental – alerta ele – será grande: haverá enormes áreas de sombreamento, pouca ventilação e, em consequência, má qualidade de vida.

Movimento Moinhos Vive quer preservar três casas da Rua Luciana de Abreu l Foto: Moinhos Vive

As casas de número 242, 266 e 272 da Luciana de Abreu teriam sido construídas, em 1930, como moradia dos mestres cervejeiros que vieram da Alemanha para trabalhar na Cervejaria Becker, que deu origem à Cervejaria Continental e, por fim, à Cervejaria Brahma. Uma delas, a de número 272, foi projetada pelo arquiteto austríaco Egon Weindörfer. As outras duas pelo arquiteto alemão Franz Filsinger.

Azevedo Moura se queixa da postura da Prefeitura e da Câmara Municipal que, segundo diz, não apoiam o movimento Moinhos Vive. Ele dá como exemplo de preservação a política japonesa, que prevê o impacto de vizinhança: qualquer prédio para ser construído deve contar com a aprovação dos vizinhos. Se eles se sentirem prejudicados pelo novo empreendimento, a construção não sairá ou – para sair – deverá indenizar os que se sentem prejudicados.

Endereços:

– Igreja Nossa Senhora das Dores – Rua Riachuelo, 630 – Centro – Porto Alegre
Fone: 51.3228-7376
Horário de funcionamento: de segunda a sexta: das 8h30 às 12h e da 12h30 às 19h30; fins de semana: das 8h30 às 12h e das 13h30 às 19h30

– Casario da Félix da Cunha – Rua Félix da Cunha, 1143, 1145, 1155, 1157, 1167, 1169, 1179, 1181 e 1215 – Moinhos de Vento – Porto Alegre

De onde são?

Mais um teste para você.  Olhe bem as fotos abaixo e diga de que prédio histórico elas são.

Ramiro Furquim/Sul21
Ramiro Furquim/Sul21
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Ramiro Furquim/Sul21
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