Noticias|Últimas Notícias>Política
|
31 de outubro de 2011
|
15:55

Câncer de Lula é motivo de ataques ao SUS e ao ex-presidente

Por
Sul 21
[email protected]
Câncer de Lula é motivo de ataques ao SUS e ao ex-presidente
Câncer de Lula é motivo de ataques ao SUS e ao ex-presidente
O ex-presidente Lula chega ao Hospital Sírio-Libanês, onde iniciará sessões de quimioterapia para combater um câncer na laringe | Divulgação: Instituto Lula

Rachel Duarte

Como não poderia ser diferente, a notícia do diagnóstico de câncer na laringe do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está causando enorme repercussão. Desde a revelação da doença, no último sábado (29), Lula recebeu centenas de mensagens de solidariedade e votos de pronto restabelecimento. Após completar 66 anos de idade, na última quinta-feira (27), uma ironia do destino levou o hábil orador a enfrentar um tratamento oncológico a partir desta segunda-feira, 31, tratamento que pode afetar sua voz. Mesmo diante da grave enfermidade do ex-presidente, há quem brinque com a doença de Lula e se aproveite do episódio para criticar o Sistema Único de Saúde (SUS).

Ao mesmo tempo em que recebia apoio da colega de partido e atual presidenta, Dilma Rousseff, e de presidentes latino-americanos como Fernando Lugo (Paraguai), Rafael Correa (Equador) e Hugo Chávez (Venezuela), Lula também recebeu ligações de políticos da oposição. Porém, na internet, desde sábado, houve intensos pedidos para que o ex-presidente seja atendido pelo SUS. Uma campanha de gosto duvidoso foi criada. A crítica subjacente é à qualidade do serviço público de saúde no Brasil, mas o conteúdo e a insistência sugerem claramente que o presidente deveria sucumbir a um sistema defendido por ele.

O vídeo abaixo, postado pelo paulista Dâniel Fraga, explicita o teor da tese formulada nas redes sociais no último final de semana, de que Lula seria hipócrita por se tratar em hospital particular e não utilizar o SUS, já que sempre defendeu o sistema público de saúde do Brasil.

http://www.youtube.com/watch?v=Itkt-_4qFDA&feature=player_embedded

No twitter, está havendo uma guerra de hashtags. Há a hashtag #LulanoSUS (ver tweets aqui) e a reação através do #ForçaLula (tweets aqui).

Ataques a Lula são políticos e motivados por ódio, diz psicanalista

Diante do caráter das falas que circulam na internet e da utilização de uma doença para fazer “crítica social”, o psicanalista Enéas de Souza comenta que se trata de um movimento organizado e de grupos específicos. “É uma tentativa da direita conservadora seguir desconstruindo o ‘lulismo’. Está implícita, nestas atitudes exploratórias, a tentativa de invalidar a continuidade do governo Dilma e uma possível sucessão de Lula”, fala.

Atingir Dilma com o argumento da deficiência do SUS e se aproveitar do câncer do Lula como forma de “inutilizá-lo” politicamente, são aspectos também considerados por Souza para entender a onda da internet. “Na política não existe humanidade, principalmente entre adversários políticos. Este jogo é para abalar o reconhecimento que Lula possui e transformar em outra coisa o que ele construiu no país, coisa que os setores mais conservadores insistem em fazer. Apesar das deficiências do SUS, por que não apontam soluções?”, indaga.

Enéas de Souza é enfático ao afirmar que o fato não se trata de uma pressão psicológica movida pela maldade subjetiva que reside em todos os seres humanos. “De acordo com Freud, o homem não nasceu para a felicidade. Ele deseja o mal, deseja subjugar o próximo e é capaz de ansiar pela aniquilação deste. Esta estrutura mais profunda da subjetividade humana pode vir à tona de várias formas. Mas, esta que estão fazendo com o Lula ainda estaria mais no campo do imaginário. O que há, de fato, é um jogo político”, salienta.

A boataria com requintes de crueldade seria inclusive uma estratégia política precoce, analisa o psicanalista. “Nós não sabemos bem como é o câncer e o grau de comprometimento da doença. A possibilidade de cura é muito grande”. Comparando com outros momentos da história, Enéas de Souza afirma que atacar o Lula é, além de uma forma de expressar os rancores mais profundos de pessoas descontentes com o ex-presidente, algo inédito. “Nem com Figueiredo, que se operou nos EUA, ou mesmo com Tancredo Neves, que viveu uma situação dramática até falecer, não fizeram isso”, diz. E ironiza: “Mesmo que o SUS fosse deficiente, sendo o Lula como ele é, se ele fosse atendido na rede pública, seria tratado muito bem”.

O “perigo” do SUS

Na avaliação do especialista em Saúde Coletiva e pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Roberto Passos Nogueira, neste caso a crítica ao SUS  é completamente infundada, tanto do ponto de vista humano, quanto científico. “O atendimento do SUS em casos de alta complexidade, chamado de atendimento terciário, é muito bom. Há uma defasagem de recursos humanos para atendimento especializado, na saúde secundária. Há longas filas e o primeiro atendimento pode ser penoso, mas eu, um pesquisador da área da saúde, se tiver um câncer, vou procurar o SUS para me tratar”, afirma.

Segundo Nogueira, os comentários na internet são uma tentativa de desqualificar o SUS e podem ser associados a pessoas que desconhecem a medicina e o sistema público de saúde. “Temos estatísticas que comprovam que a classe média utiliza o SUS para casos de alta complexidade, que são os serviços mais caros”, conta Nogueira. Ele explica que, de acordo com a realidade local, o atendimento pode ser mais ou menos eficiente em determinada especialidades, mas que, de modo geral, o SUS é criticado erradamente. “Não é uma melhora significativa, mas a saúde pública avançou nos últimos 20 anos. A progressão ainda é muito lenta em relação ao tamanho da demanda da população”, diz.

Para o caso específico de câncer, que é uma doença que pode ser detectada antes de tornar-se fatal, existe uma ampla ação dos organismos federais em programas e políticas públicas. Na última semana, o Ministério da Saúde criou a Rede Nacional de Desenvolvimento e Inovação de Fármacos Anticâncer (Redefac). O objetivo da rede é articular projetos de desenvolvimento de fármacos na área de oncologia com potencial translacional para atender às demandas do SUS.

De acordo com o Boletim de Pesquisas Sociais do IPEA, nenhum grupo populacional está de fora da cobertura do SUS, seja nas políticas públicas ou nos programas desenvolvidos pelo governo federal.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora