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25 de maio de 2011
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15:46

José de Abreu: “A politização dos indivíduos na rede está acima dos partidos e dos governos”

Por
Sul 21
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Ramiro Furquim/Sul21

Rachel Duarte

Jovem militante nos tempos da ditadura militar, gaúcho por adoção, ator global há 30 anos e um influente ativista da internet, José de Abreu prestigiou o lançamento do Gabinete Digital de Tarso Genro nesta terça-feira (24) e, ao final do evento, conversou com o Sul21. Ele falou sobre sua relação com a política e a militância assumida no Partido dos Trabalhadores (PT).

Petista tradicional desde 1989, o ator de 65 anos tornou-se atração no Twitter durante as eleições de 2010 pelo desempenho em favor do governo de Luiz Inácio Lula da Silva e pela eleição de Dilma Rousseff. Com mais de 12 mil seguidores na rede social, ele analisou o poder da web para o exercício da democracia. Para José de Abreu, ao contrário do que dizem alguns críticos, a internet é um meio de politização e tem um poder fundamental nas relações sociais e políticas na era da globalização.

Trabalhando na novela Insensato Coração, Abreu acredita que as concessões das grandes emissoras brasileiras estão ameaçadas com a expansão das mídias digitais e não deixou de citar a decadência das redes brasileiras de TV e mesmo da Rede Globo diante do crescimento das empresas de telecomunicações estrangeiras no Brasil.

Sul21 – O senhor já foi preso por perseguição política durante o período de exceção e buscou refúgio no Rio Grande do Sul. Por viver aqui, em Pelotas, o senhor disse que adotou a cidade e não esconde o título de Cidadão Pelotense.

José de Abreu (JA) – Fui preso por dois meses, em 1968, durante o congresso na UNE (União Nacional dos Estudantes). Saí do país no final de 1972, quando tive um exílio forçado na Holanda, e voltei no final do ano seguinte para Pelotas (RS). Eu escolhi o Rio Grande do Sul porque era bem perto do Uruguai, qualquer coisa era fácil de escapar bem rápido. (risos) E, quando eu recebi o título de Cidadão Pelotense, o presidente da Câmara de Vereadores disse que estava me concedendo o título ciente de que eu não iria assumi-lo… Mas eu tenho orgulho de dizer que sou de Pelotas, apesar de isso ser motivo de piada. Meus dois filhos são bem machos inclusive, a filha um pouco menos. (risos)

Ramiro Furquim/Sul21

Sul21 – Qual a razão da sua vinda ao RS para o lançamento do Gabinete Digital de Tarso Genro? Motivação ideológica?

JA – Não. Ele ficou surpreso quando me viu aqui. Eu vim sem o governador saber que viria. A minha vinda aqui foi pelo meu ativismo na internet. Aqui, o governo gaúcho compreendeu o avanço da cultura digital no mundo, potencializada no Brasil com o governo Lula. No governo Lula, o Ministério da Cultura foi aberto para os cidadãos e poderíamos ser os primeiros do mundo em liberdade digital, se o governo Dilma compreendesse isso. Agora existe uma mudança neste sentido. Mas, eu tenho uma esperança que o governo federal mude isso. Se não acontecer, nós vamos para a rua.

Sul – Qual é a sua crítica?

JA – Eu sou um interneteiro antigo, entrei no BBS na década de 90. Na campanha de 1995 eu tinha um blog muito ativo e tive que abandoná-lo porque fui processado várias vezes. A impressão que eu tenho é que a presidenta Dilma Rousseff não sabia o que estava acontecendo em termos de cultura digital quando nomeou a Ana (Ana de Hollanda, atual Ministra da Cultura). O trabalho que havia sido feito no governo Lula foi completamente ignorado. O Ministério da Cultura tinha virado um acampamento virtual, do qual os usuários se empoderaram.

Sul21 – Qual a importância da internet para o exercício da democracia e como o senhor avalia o comportamento do Brasil com revolução das mídias digitais?

JA – A mídia digital está tomando conta. As pessoas estão impondo outro modo de governança.

Há uma politização dos indivíduos na rede nunca vista no mundo e que está acima dos partidos e dos governos.

E, se os partidos ou governos não se antenarem serão levados de roldão. Quando eles menos esperarem terá uma multidão na porta pedindo mudanças e eles, se não acompanham os debates na internet, não saberão nem que mudanças que as pessoas querem.

Ramiro Furquim/Sul21

Sul21 – Vários movimentos de protesto no mundo estão sendo organizados com o uso das redes sociais da internet. Qual o significado desse fenômeno que está mudando as relações sociais, políticas, culturais e econômicas no século 21?

JA – A internet significa para o mundo uma nova forma de democracia direta. Desde Atenas (Grécia) não tínhamos algo tão aberto. Os governos e nós mesmos ainda estamos nos apropriando desta ferramenta e entendendo o poder que temos nas mãos. Eu ainda levo um susto no momento em que estou fazendo uma twitcam e segundos depois o Lula me liga, na condição de presidente ou ex-presidente da República. Então eu começo a me dar conta que o que eu faço tem certo poder. Mas eu fui criando a minha rede de seguidores sem me dar conta disso. Agora, as pessoas que seguem buscam conteúdo. É outro tipo de seguidor. Eu falo só de política. Mas os governos têm que ter este estalo.

O gabinete digital gaúcho irá sentir este poder com a criação desta ferramenta. Outros governadores também já se anteciparam, o Déda está fazendo isso em Aracaju, no Ceará o Cid Gomes também está fazendo. Se a Dilma não se der conta ela pode ser surpreendida com uma maré de pessoas pedindo liberdade. Liberdade de quê? Ela nem saberá…

Sul21 – Para o real exercício da democracia com as mídias digitais é preciso que todos possam ter acesso à internet. Qual a sua opinião sobre o Plano Nacional de Banda Larga que está sendo gerido e debatido no Brasil?

JA – Eu não acho que a Lei dos Medios (inspirada na Ley de Medios da Argentina que cria mecanismos para combater a concentração midiática do país), que defendem alguns ativistas como o Paulo Henrique Amorim, seja a melhor alternativa para o Brasil. Ela pega apenas rádios e televisões, não pega jornal, por exemplo. A programação de uma emissora de TV, seja a RBS ou a Record aqui no RS, só tem 10% de jornalismo. A Ley de Medios só funcionaria também para as emissoras outorgadas, com concessão. Com a chegada da internet já está havendo um impacto nas emissoras. A rede é ilimitada. Tu pode ter dois canais um em cima do outro. O mesmo com as TVs a cabo e o sinal das parabólicas. As concessões irão acabar…

Ramiro Furquim/Sul21

Sul21 – O senhor está sendo otimista, porque este debate da regulação dos meios é muito velado e há um grande monopólio constituído.

JA – As grandes oligarquias são grandes só no Brasil. Mas, com a chegada das teles estrangeiras a Globo e a Record ficaram pequenas. O mundo digital engole estas emissoras. Quem é a Globo perto da Google?

A Globo é um pintinho perto da Google, da Tim, da Telefônica da Espanha ou da Telecom de Portugal.

A diferença no faturamento é absurda da Globo (R$ 28 bi) em comparação com as teles estrangeiras (R$ 180 bi). Agora, eu acho que é importante ter banda larga para todo mundo. Uma grande rede mundial para conectar todos em wi-fi seria maravilhosa. No RJ toda a praia tem wi-fi.


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